null Gabriel Aragão discute direitos autorais em trabalho apresentado na Unifor

Ter, 27 Dezembro 2022 12:09

Gabriel Aragão discute direitos autorais em trabalho apresentado na Unifor

O escritor, músico e compositor, membro dos Selvagens À Procura de Lei, teve como tema do seu Trabalho de Conclusão de Curso “Direitos autorais e a hipossuficiência do criador musical”


Em entrevista exclusiva ao Unifor Notícias Mobile, o artista conta como conciliou a vida como músico profissional e os desafios de escrever sobre direitos autorais  (Foto: Felipe Kautz)
Em entrevista exclusiva ao Unifor Notícias Mobile, o artista conta como conciliou a vida como músico profissional e os desafios de escrever sobre direitos autorais (Foto: Felipe Kautz)

Artista multifacetado, Gabriel Aragão usa a arte em diferentes expressões para contar histórias. Seja por meio da música ou por meio da escrita, o, agora, bacharel em Direito pela Universidade de Fortaleza, da Fundação Edson Queiroz, busca uma só finalidade: encontrar sentido para a própria veia artística. “Lançar canções, em grupo ou carreira solo, e, ao mesmo tempo, lançar um livro de poesias, terminar Direito faz muito sentido, porque trabalho profissionalmente com a arte”, diz em entrevista exclusiva ao Unifor Notícias Mobile

No último dia 13 de dezembro, Gabriel, que também é vocalista dos Selvagens À Procura de Lei, apresentou seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) sobre o tema “Direitos autorais e a hipossuficiência do criador musical”. 

O objetivo do trabalho, que teve orientação do mestre e professor Carlos Henrique de Castro, é analisar a relação entre o nível de transparência e a qualidade da remuneração dos criadores musicais no contexto do streaming no Brasil. Também estiveram presentes na banca o músico, advogado e egresso da Unifor, professor Ricardo Bacelar, e o advogado criminalista, egresso e professor da Unifor, José Armando da Costa

Arte e Direito

Para realizar a pesquisa, o artista traçou o histórico dos direitos autorais no mundo até chegar em um breve resumo do modelo brasileiro de gestão coletiva realizada pelo Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (ECAD) — entidade responsável pela arrecadação e distribuição dos direitos autorais das músicas aos autores e demais titulares —; e estudou a Lei nº 9.610/98.

A partir dessas informações, ele estudou o impacto da internet na indústria fonográfica até a ascensão do streaming, definindo-o em termos técnicos, mas também medindo suas camadas mais reservadas, como a psicologia do algoritmo, por exemplo. 

O insight que deu vazão ao trabalho veio da própria experiência artística. Segundo Gabriel, quase ninguém do meio parece entender de fato o que acontece nos direitos autorais —  que todo criador de obra intelectual tem sobre a própria criação. “O pessoal da década de 70, quase não se preocupava com isso. Deixavam contratos na ‘mão’ da gravadora, se preocupando apenas em ser o intérprete, o compositor. Não havia incentivo para estudar e entender quais eram os seus direitos e deveres como compositor”, esclarece.


“Quando chegamos na atual geração de músicos, que eu me incluo, temos o termo ‘artista independente’, que quer dizer que você ‘se vira’, você faz tudo. O fato de ser independente exige que o artista tenha compreensão maior de como as coisas funcionam. [...] Sendo quem sou, me veio a vontade de contribuir com a categoria, porque esses livros que tratam dos direitos autorais são bem complicados para os músicos que não têm conhecimento jurídico para lidar com eles. Li livros que tentam ser cada vez mais simples, mas ainda assim acredito serem apenas para a categoria que atualmente me encaixo: um músico profissional que estudou Direito” – Gabriel Aragão, escritor, compositor e bacharel em Direito

Concessões no caminho 

Há dez anos, já próximo de concluir a graduação na Unifor, Gabriel largou o curso para seguir a carreira artística com os Selvagens À Procura de Lei. O nome da banda, conta, surgiu em uma aula de Sociologia, com o professor Sidney Guerra, no campus. “Depois de formar a banda, quando a coisa foi ficando séria, no sentido de me mudar para São Paulo, assinar com uma grande gravadora e lançar discos, acabei abandonando o curso”, conta Gabriel. 

Mesmo tendo que fazer concessões, a experiência em sala de aula, pontua, foi importante ao viver como músico profissional, uma vez que, na estrada e lançando discos, aprendeu muito. Na banda, por exemplo, Gabriel ficava à frente da administração e contato direto com advogados, editoras musicais, distribuidoras, gravadoras, além da leitura de contratos.

“[Isso] foi me reaproximando gradualmente do Direito até esse momento atual, em que decidi concluir o curso, já com a cabeça e o interesse renovado pelo tema dos direitos autorais. Então, saí do Direito devido à música, mas voltei para o Direito também devido à música”, destaca. 


Como vocalista dos Selvagens À Procura de Lei – banda cearense formada por Gabriel Aragão, Caio Evangelista, Rafael Martins e Nicholas Magalhães, da esquerda para a direita –, Gabriel tocou no Rock in Rio e no Lollapalooza, os maiores festivais do Brasil (Foto: Murilo Amancio)

Orientador de Gabriel, o professor Carlos Henrique não esconde a admiração pela relação de carinho e trabalho que construiu com o orientando. Segundo conta, conheceu Gabriel há muitos anos, tendo sido supervisor do então estudante quando era estagiário. O docente revela que, no entanto, o músico sempre foi insatisfeito com a área do Direito: "o sonho dele era ser artista".

"Faltando pouco para se formar, foi construir a carreira artística, tocou no Rock in Rio, Lollapalooza e escreveu muitas músicas, assinou contrato com uma grande gravadora, lançou um livro. Agora, já casado e pai, decidiu voltar para concluir o curso. Ele batalhou e se dedicou para entregar um trabalho bem feito, inédito”, conta o Carlos. 

Sobre a banca composta para avaliar o trabalho, Henrique lembra que o desejo era que fossem dois professores de peso com experiência no meio artístico. “O professor Ricardo Bacelar é músico, tem um estúdio de gravação e é muito conhecido no cenário nacional, ou seja, entende muito de Direito e muito de música. E o professor José Armando da Costa também é conhecedor de música, tem banda e é um cantor maravilhoso, que contribuiu bastante. A avaliação demorou quase duas horas, foi muito legal e relevante. Para o Direito é inédito e para o mundo musical é mais ainda”, finaliza.

Como manter o equilíbrio 

Segundo o artista, é necessária uma “dança mental” para equilibrar esses múltiplos interesses e conseguir executar os compromissos. Em 2022, ano atípico devido à Copa do Mundo e as eleições, que encurtaram o semestre, o desafio foi maior, porque também se deu a volta dos grandes eventos. Como músico profissional, Gabriel não pode abdicar de estar na estrada.

Foi preciso um malabarismo grande para conseguir adiantar todas as atividades e estar na estrada estudando. Não direi que foi fácil, mas também foi bom, uma vez que, ao longo da escrita, pude conversar com as pessoas que viviam disso (direitos autorais): músicos e autores, mas também outras pessoas que trabalham na indústria fonográfica: produtores musicais, empresário e até advogados, especialistas nos direitos culturais. Então, foi ótimo, porque dava para ver o interesse de todo mundo, do mercado da música, sobre um estudo mais aprofundado de alguém que também é músico profissional”, conta. 

A pesquisa, revela, não será encerrada após a apresentação do trabalho. A ideia é que boa parte do que está na monografia seja transformada em um livro, mas com linguagem popular, que seja compreensível para compositores, músicos e profissionais de qualquer área artística. “Acredito que falta uma maneira melhor de ensinar e transmitir o conhecimento, talvez por meio de gráficos, mas, certamente, precisa haver uma linguagem menos jurídica”.


Em 2021, Gabriel Aragão lançou sua primeira obra: “O Livro Das Impermanências” (Foto: Reprodução/Instagram)

A vontade de continuar estudando e aprendendo com direitos autorais, diz, é uma realidade. “Por enquanto, quero muito escrever esse livro, mas, quem sabe, continuar estudando de uma maneira formal e acadêmica, está no horizonte de possibilidades”, finaliza.