Menos ultraprocessados nas escolas: entenda como política nacional busca proteger a saúde infantil

Nutricionista avalia os aspectos da nova regulamentação que reduz progressivamente a presença de alimentos ultraprocessados na merenda e aponta caminhos para uma alimentação mais justa e saudável

Em vigor desde fevereiro de 2024, a nova regulamentação do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) estabelece uma redução gradual no uso de alimentos ultraprocessados na merenda das escolas públicas. A meta é clara: restringir a presença desses produtos para 15% do total da oferta nutricional este ano, caindo para 10% em 2026. A medida integra uma estratégia nacional para garantir refeições mais saudáveis e combater os efeitos nocivos dos ultraprocessados, especialmente durante a infância.

A mudança ocorre em um momento em que se intensificam os debates sobre a influência da indústria alimentícia nas políticas públicas. Uma reportagem de O Joio e o Trigo revela como as empresas têm atuado para frear avanços legislativos que limitariam o acesso de seus produtos ao ambiente escolar. Lobby político, marketing direcionado ao público infantil e financiamento de pesquisas são algumas das táticas utilizadas.

O que são os ultraprocessados e por que estão sendo retirados?

Criada por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e adotada no Guia Alimentar para a População Brasileira , a classificação define os ultraprocessados como formulações industriais que combinam ingredientes extraídos de alimentos in natura com aditivos como corantes, aromatizantes e emulsificantes.

Alguns exemplos de alimentos ultraprocessados presentes no dia a dia de muitas pessoas são:

  • Refrigerantes
  • Biscoitos recheados
  • Salgadinhos de pacote (como chips)
  • Macarrão instantâneo


Gráfico exemplifica o que são alimentos in natura, processados e ultraprocessados (Foto: Jornal USP)

“Esses produtos não são propriamente alimentos. Eles têm baixo valor nutricional e alto teor de açúcar, gordura saturada e sódio, o que os torna perigosos, especialmente quando consumidos por crianças em fase de desenvolvimento”, explica a nutricionista Maria Soraia Pinto, doutora em Saúde Pública e docente do curso de Nutrição da Universidade de Fortaleza — instituição mantida pela Fundação Edson Queiroz

Segundo ela, os riscos não se limitam ao sobrepeso. “Há associação entre o consumo contínuo de ultraprocessados e doenças crônicas como diabetes tipo 2, hipertensão e distúrbios metabólicos. Na infância, esses efeitos são agravados, porque é quando se formam os hábitos alimentares que acompanharão o indivíduo por toda a vida”, afirma a nutricionista.

Escola como espaço de transformação alimentar

Na Unifor, o projeto de extensão Educação Alimentar e Nutricional atua em escolas públicas de Fortaleza com o objetivo de estimular desde cedo a adoção de hábitos saudáveis, por meio do incentivo ao consumo de alimentos ricos em vitaminas e nutrientes essenciais. As ações são realizadas por alunos do curso de Nutrição, sob orientação docente. Entre os professores, está a própria Maria Soraia Pinto.

O ambiente escolar, como lembra a docente, é um dos espaços mais potentes para a formação de hábitos saudáveis. “As políticas públicas de alimentação são estratégias fundamentais para promover o direito humano à alimentação adequada”, ressalta Soraia. Ela destaca que quando uma criança consome diariamente alimentos in natura e poucos alimentos processados, ela tende a reproduzir esse hábito em casa.

Nesse contexto, o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), promovido pelo governo brasileiro, cumpre papel central nessa transformação: além de oferecer refeições equilibradas, a iniciativa estimula a agricultura familiar e integra ações de educação alimentar. 


“A presença de nutricionistas e educadores bem formados dentro das escolas é indispensável para a continuidade dessas práticas. Só assim conseguimos associar teoria e prática, garantindo que a escola se torne um espaço de promoção da saúde” —  Maria Soraia Pinto, professora do curso de Nutrição da Unifor e doutora em Saúde Pública
 


Educação nutricional é necessária, mas não suficiente

A ampla presença dos ultraprocessados na alimentação cotidiana, segundo a professora Maria Soraia Pinto, é resultado de um desequilíbrio evidente entre o poder da indústria e a capacidade de regulação do Estado

“Esses produtos são baratos, têm longa validade e são altamente palatáveis. Eles se beneficiam de um sistema que os subsidia com isenções fiscais e incentivos logísticos. Além disso, a indústria investe pesado em publicidade, muitas vezes voltada diretamente para o público infantil”, declara a professora.

Apesar disso, ela reforça que a educação nutricional tem papel importante, desde que seja contínua, crítica e integrada a outras políticas. Para a docente, apenas informar a população não é suficiente, é necessário ações estruturantes, como o incentivo à produção local, a rotulagem clara dos alimentos, a regulação da publicidade e o fortalecimento de políticas de segurança alimentar.


Atividades de Educação Alimentar e Nutricional (EAN) em escolas das redes públicas de Fortaleza, desenvolvida pelo curso de Nutrição da Unifor (Foto: Divulgação)

Entre as conquistas recentes, Maria Soraia destaca a criação do Guia Alimentar, referência mundial, e a implementação de alertas de rotulagem nutricional. “São passos importantes, mas ainda enfrentamos muitos obstáculos, como a atuação intensa de grupos econômicos contrários à regulação”, afirma.

A nutricionista aponta que a pressão da indústria, a falta de articulação entre os diferentes setores do governo e a desinformação da população são alguns dos principais entraves para o avanço de uma política alimentar robusta no Brasil.

Para avançar, ela defende o fortalecimento de políticas que aproximem produção e consumo de alimentos saudáveis. “Iniciativas como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) , o apoio à agricultura familiar e as hortas escolares e comunitárias são caminhos possíveis. A democratização do acesso a alimentos in natura é também uma questão de justiça social”, destaca a docente.

O nutricionista como agente de transformação social

Maria Soraia ressalta que o nutricionista precisa ser mais do que um prescritor de dietas. “Somos agentes de políticas públicas. Atuamos na assistência, na educação, na formulação de programas e no enfrentamento das desigualdades alimentares. Nossa formação precisa ser técnica, sim, mas também ética e socialmente consciente”, declara. 

Na Unifor, a preparação dos futuros profissionais começa cedo, com estágios e projetos de extensão em comunidades, escolas e unidades de saúde. “Nossos alunos vivenciam a realidade da população desde os primeiros semestres, aprendem a dialogar com diferentes públicos e a transformar o conhecimento técnico em impacto social”, conclui a docente do curso de Nutrição .

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