Pesquisa Unifor: Estudo analisa treinamento para AVC em fellowships no Brasil

seg, 20 maio 2024 18:09

Pesquisa Unifor: Estudo analisa treinamento para AVC em fellowships no Brasil

O trabalho aponta que, apesar do alto indíce, os programas de treinamento em neurologia vascular permanecem subdesenvolvidos em muitos países


O trabalho tem como objetivo analisar de forma abrangente o perfil de estagiários de neurologia vascular no Brasil (Foto: Getty Images)
O trabalho tem como objetivo analisar de forma abrangente o perfil de estagiários de neurologia vascular no Brasil (Foto: Getty Images)

O Acidente Vascular Cerebral (AVC) ocorre quando os vasos que levam sangue ao cérebro entopem ou se rompem, provocando a paralisia da atividade cerebral que fica sem circulação sanguínea. De acordo com dados do Portal da Transparência do Registro Civil, até outubro de 2023, a doença já havia vitimado 77 mil pessoas no país, configurando-se como uma das que mais mata no Brasil. 

Apesar do grande impacto da enfermidade, os treinamentos realizados por profissionais da saúde em neurologia vascular ainda possuem um déficit em muitos países, principalmente subdesenvolvidos.

Por isso, Fernanda Maia, professora do Programa de Pós-Graduação em Ciências Médicas (PPGCM) da Universidade de Fortaleza — instituição da Fundação Edson Queiroz —, participou da produção do artigo “Comprehensive portrait of stroke fellowship training in Brazil: A national survey study” (“Retrato abrangente do treinamento em fellowships de AVC no Brasil: um estudo de pesquisa nacional”, em tradução livre).

O trabalho analisa, de forma abrangente, o perfil de estagiários de neurologia vascular no Brasil para descrever o conteúdo do programa de treinamento a partir das perspectivas desses aprendizes e dos diretores da iniciativa. Com isso, foram investigados aspectos curriculares, sociodemográficos e econômicos dos programas e dos participantes no treinamento. 

“O AVC é hoje a principal causa de incapacidade adquirida em todo o mundo, não apenas no Brasil. Terapias específicas têm um grande impacto na prevenção desses déficits. Para aplicar essas terapias, precisamos de mais pessoas bem treinadas em centros especializados”, pontua Fernanda, reforçando a importância de um atendimento rápido e eficiente aos pacientes de AVC para minimizar seus efeitos.


“Tratar o AVC rápida e eficientemente beneficia a sociedade como um todo, reduzindo gastos com saúde e benefícios por incapacidade física. O AVC não afeta apenas o paciente, mas também toda a família e a comunidade, impactando empregos, finanças e os sistemas de previdência social. Treinar profissionais para fornecer o melhor tratamento possível é essencial para reduzir as sequelas dessa doença devastadora”Fernanda Maia, pesquisadora e professora do PPGCM da Unifor

Além de Fernanda, participaram do estudo George Nunes, Fabricio Oliveira e Alessandra Braga Morais, membros da equipe de neurologia do Hospital Geral de Fortaleza (HGF). Também fizeram parte Octavio Marques e Gisele Sampaio, que compõem a liderança na área de AVC de São Paulo; Sheila Martins, atual presidente da World Stroke Organization; e Alexandre Poppe, da Divisão de Neurologia do Centro Hospitalar da Universidade de Montreal, no Canadá.

Metodologia

Durante o desenvolvimento da pesquisa, a equipe realizou um estudo observacional para descrever as características específicas dos estagiários e dos programas de treinamento em neurologia vascular no Brasil

O estudo foi conduzido de junho a setembro de 2023, usando uma pesquisa segura baseada na web e enviada a bolsistas ativos e diretores de todos os programas de bolsas de neurologia vascular conhecidos no país — com o total de 12 em um país de mais de 200 milhões de pessoas.

Um questionário foi aplicado aos formandos dos programas e aos seus diretores. A primeira parte do interrogatório dos colegas incluía informações sobre idade, sexo e residência anterior. Na segunda parte, centrou-se na produção de investigação, incluindo publicações, resumos submetidos em conferências, participação em ensaios clínicos e determinados componentes curriculares, incluindo procedimentos de Doppler transcraniano.

Já a terceira seção avaliou a percepção dos colegas sobre os componentes curriculares e a aprendizagem. A parte final centrou-se nos aspectos econômicos, como apoio financeiro e rendimentos. Os questionários dos diretores de programa, por outro lado, concentraram-se principalmente em aspectos curriculares, de modo a permitir a comparação com a percepção dos bolsistas.

Conclusões 

Os pesquisadores concluíram que, ao comparar as cinco regiões do Brasil, há claras diferenças no número de programas de bolsas de neurologia vascular. As regiões mais pobres, como o Norte e o Nordeste, possuem respectivamente 0 e 0,35 programas de fellowship em neurologia vascular por 10 milhões de pessoas, refletindo uma infraestrutura comparável a países de rendimento baixo ou médio-baixo. 

Em contraste, observa-se uma maior densidade de programas nas regiões mais ricas: Centro-Oeste tem 0,62 programas por 10 milhões de pessoas, Sudeste com 0,7 e Sul com 1,03. No entanto, mesmo essas regiões mais desenvolvidas estão longe de alcançar a densidade de programas encontrada em países de rendimento mais elevado.


O AVC é considerado uma das doenças que mais matam pessoas no Brasil, segundo dados do Portal da Transparência do Registro Civil (Ilustração: Getty Images)

A pesquisa revelou uma paridade de gênero adequada entre os bolsistas, mas uma sub-representação significativa de brasileiros não-brancos. A formação clínica oferecida foi diversificada e abrangente, com financiamento parcialmente disponível. No entanto, o número de programas e formandos é insuficiente para atender à prevalência de doenças e à demografia do país, além de estarem distribuídos de forma desigual pelo território nacional.

Essas descobertas destacam o cenário atual da educação em AVC no Brasil e apontam para lacunas no treinamento que necessitam de atenção futura. Os resultados sugerem que esforços devem ser direcionados não apenas para aprimorar a formação em AVC no país, mas também em outras nações de baixa e média renda, onde a doença é desproporcionalmente elevada.

Publicação internacional 

Dada a importância do artigo para a sociedade, o artigo foi publicado em março de 2024 no Journal of Stroke & Cerebrovascular Diseases. A revista é dedicada à divulgação de pesquisas originais e revisões sobre ciência básica e clínica relacionadas ao acidente vascular cerebral e outras doenças cerebrovasculares.

Destinada a profissionais especializados no tratamento de pacientes com doenças cerebrovasculares, o periódico possui CiteScore em 4.3 e Fator de Impacto em 2.5. Ele busca fornecer informações atualizadas e relevantes para neurologistas, neurocirurgiões, cardiologistas, médicos de emergência e outros especialistas envolvidos no cuidado de pacientes com AVC.