Amizade para a vida

seg, 14 fevereiro 2022 10:50

Amizade para a vida

Jovens universitários compartilham suas impressões sobre a importância da construção dos laços de afeto em sala de aula 


Bianca Braga e Kamylle Santos, amigas e estudantes do curso de Jornalismo da Unifor (Foto: Ares Soares)
Bianca Braga e Kamylle Santos, amigas e estudantes do curso de Jornalismo da Unifor (Foto: Ares Soares)

Amizade. Substantivo feminino que, de acordo com o Dicionário Online de Português, significa “relação de afeto, de carinho, de estima e de dedicação entre duas pessoas, sendo esses sentimentos recíprocos”. Para a semântica, a definição é clara, porém, no âmbito afetivo, essa palavra relativamente pequena traz consigo um universo de significações, sentimentos e sensações.

Hoje, com o advento da tecnologia e a ascensão das redes sociais, as definições de amizade mudaram, ou melhor, foram atualizadas. As relações sociais ganharam novos significados, as formas de se conectar com outras pessoas passaram do plano físico para o virtual, e muitos relacionamentos iniciaram com um simples clique ou curtida, inclusive entre pessoas que nunca haviam se visto pessoalmente. 

A internet é uma das ferramentas mais poderosas da atualidade, e impacta quase todos os aspectos da vida em sociedade. Ela, assim como as mídias sociais, tem um potencial enorme de transformação, e serve como potencializadora dos relacionamentos contemporâneos, facilitando, muitas vezes, a manutenção de velhas amizades, e a criação de novas. 

De acordo com Ana Rebeca Medeiros, psicóloga da Central de Carreiras e Egressos da Universidade de Fortaleza, da Fundação Edson Queiroz, as redes sociais trazem facilidades para fazer e manter amizades em, pelo menos, duas instâncias. A primeira, como explica a profissional, faz referência à facilidade da comunicação, já que hoje, por não existirem mais barreiras físicas, é possível conversar com pessoas de qualquer parte do mundo.

“O segundo olhar faz menção ao grupo de pessoas que presencialmente se apresentam de forma mais tímida ou antissocial, e as redes surgem facilitando esse contato do ‘fazer amigos’. Desse modo, percebo que a amizade virtual pode trazer menos aflição para esse grupo específico”, afirma. Porém, Medeiros pontua que o conceito de amizade virtual não necessariamente é um indicativo da quantidade de amigos que um indivíduo pode ter. 

“Assim como as redes sociais podem aumentar o nosso número de laços de amizades, ela também pode nos passar uma ilusão de que temos muitos amigos. Pode acontecer que, mesmo com um número elevado de amizades virtuais, ainda exista o sentimento de solidão, e às vezes o próprio receio da solidão pode nos levar a nos apoiar cada vez mais nas redes sociais. Desse modo, entendo que as redes sociais tanto oportunizam a efetivação e manutenção de laços de amizade, como também podem trazer a sensação de solidão para o sujeito”, Ana Rebeca Medeiros, psicóloga da Central de Carreiras e Egressos da Universidade de Fortaleza.

Ainda que a tecnologia tenha facilitado a comunicação, a pandemia da Covid-19 gerou um grande impacto nos relacionamentos afetivos. O isolamento social limitou as possibilidades de sair e encontrar amigos, as aulas presenciais migraram para o virtual, eventos foram cancelados, e o home office foi efetivamente implantado para muitas pessoas, minando, assim, outras possibilidades de conhecer pessoas novas.

Dessa forma, criar novos laços de companheirismo na era digital, assim como manter os antigos, exige novas habilidades. As amizades estão mudando, e da mesma maneira que essas relações vêm sendo reconfiguradas, a Unifor também acompanha essas mudanças. A instituição serve de palco para o surgimento de muitas amizades, criadas nos corredores e espaços da instituição, e que, muitas vezes, atravessam os limites territoriais do campus.

Nesta edição, o Unifor Notícias mostra as diversas facetas da amizade, compostas por jovens que integram o corpo acadêmico da instituição, suas vozes, seus jeitos de ser, de enxergar o mundo, e, principalmente, de enxergar o próximo. Confira:

Porto seguro

Kamylle Santos e Bianca Braga, alunas do 6º semestre do curso de Jornalismo da Unifor, se conheceram no campus da Universidade ainda no primeiro período, mas só se aproximaram meses depois, de uma forma legal e inesperada, que envolve muito nervosismo e um estágio voluntário no Núcleo Integrado de Comunicação (NIC) da instituição. 

“Eu estava muito indecisa com a questão do estágio. Um dia, fui almoçar no Centro de Convivência e estava contando para algumas meninas que estava pensando em me inscrever, mas não sabia onde poderia me encaixar, até que a Bianca, que também estava lá, perguntou se eu gostaria que ela me mostrasse as células do NIC, e eu concordei. A partir desse momento, eu já fiquei nervosa só com o fato de conhecer o local e a possibilidade de me inscrever, e ela ficou o tempo todo me acalmando e falando que eu ia adorar as pessoas. Quando chegamos lá, ela me apresentou para todo mundo, e fez eu me sentir muito bem acolhida no local”, relembra Kamylle.

Para a aluna, o gesto da amiga, que até então era apenas uma colega, foi o empurrão que ela precisava para encarar, superar seus medos e ir atrás do que queria. A partir desse momento, Santos conta que as duas começaram a se aproximar de uma forma bem orgânica, por meio de trabalhos da faculdade, já que estavam matriculadas nas mesmas disciplinas, e assim desenvolveram uma amizade muito bacana.

“A gente começou a compartilhar muito uma com a outra, e se sentir acolhida também, porque em tudo o que eu fazia, ela me apoiava, tudo que ela fazia, eu a apoiava, e a gente se impulsionava. Queremos sempre ver mais uma da outra e queremos que a outra brilhe”, afirma a futura jornalista, e acrescenta que sentir esse apoio de perto, o qual ela tanto ouviu falar antes de ingressar na universidade, é muito bom. 

Com a pandemia, todos os relacionamentos foram afetados, mas aqueles que eram relativamente novos e dependiam, até certo ponto, da presença diária para se consolidarem, talvez tenham sofrido ainda mais. Antes, as duas se falavam praticamente todos os dias, tanto pessoalmente, por estudarem juntas, quanto por aplicativos de mensagem em horários fora da faculdade. Mas, o cenário epidemiológico mudou isso e muitos outros aspectos da relação que estavam construindo.

Ainda que, segundo Santos, que preza pelo contato físico, a relação tenha saturado um pouco devido ao que ela chama de “ciclo sem fim de contato virtual”, Bianca acredita que a pandemia também impactou de forma positiva: “por incrível que pareça, ficamos ainda mais próximas quando começou a quarentena. Começamos a nos falar todos os dias e fomos de apenas amigas da universidade para confidentes. Porém, com a necessidade do distanciamento social, ficamos sem nos ver por um longo período de tempo”.

Hoje, as duas não se falam mais diariamente, e sabem que isso foi consequência do cenário atual, mas, mesmo que a dinâmica da relação tenha mudado, as amigas entendem que o ambiente virtual é cansativo, e aprenderam a lidar com as ferramentas que tinham ao seu dispor. Ainda assim, Kamylle diz que sua amiga é como um porto seguro, e garante que a amizade continua fluindo super bem, porque o carinho do início do relacionamento é o mesmo.

Com o início do semestre letivo, e o resto do ano aberto para possibilidades e para a construção de novas memórias, a estudante revela que sua expectativa para o retorno presencial é apenas uma: parar de sentir saudade. “Eu sinto falta do contato físico, que, para mim, é muito importante. Eu sei que a gente ainda não está podendo ter tanto esse contato, mas o que eu mais espero é parar de sentir saudade, porque eu vou voltar a ver as pessoas que importam pra mim e que eu senti falta”, explica.

Bianca revela que não espera criar novos laços de amizade, já que, por já ter passado da metade do curso, ela percebe que todos os seus colegas já têm grupos formados, o que torna difícil a aproximação com pessoas novas. “Mas, se acontecer, vou ficar feliz. É bom conhecer novos rostos, ou reconhecer aqueles que antes só via pela foto na chamada online”, afirma. 

Aproximação 

E quando a amizade é tão boa que os amigos decidem até fazer um Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) juntos? É o caso de Carlos José de Andrade Neto, mais conhecido como Casé, e Matheus Freire, alunos do 7º semestre do curso de Educação Física da Unifor. O primeiro lembra que os dois se aproximaram com o tempo, mas que a disciplina de Futebol e Futsal teve uma certa importância, já que estavam na mesma equipe, o que facilitou a aproximação.

As memórias da construção da amizade são complementares. Matheus conta: “a gente se conheceu na universidade, e em algumas cadeiras percebemos que tínhamos interesses bem parecidos, tanto pessoal como profissionalmente. Depois, descobrimos que morávamos perto e, como consequência, começamos a fazer trabalhos sempre juntos, e aí desenvolvemos essa amizade”.

Mesmo os dois andando colados na universidade, Casé explica que a pandemia atrapalhou um pouco, já que não estavam mais podendo se ver presencialmente, mas ele acrescenta que a amizade é forte, e quando a situação estava melhor, iam para casa um do outro, marcavam um churrasco e faziam questão de se ver. Freire já é mais otimista, e afirma que a pandemia impactou de forma positiva em sua amizade, e que o ensino remoto aproximou os dois ainda mais, já que sempre tiravam dúvidas um com o outro. 

Por falar em remoto, os dois amigos possuem opiniões divergentes em relação ao papel da internet e das redes sociais nas amizades. Neto diz que não consegue ser o mesmo no ambiente virtual, e que para uma amizade ser sincera e verdadeira, o presencial se faz necessário. Já Freire encara a tecnologia como uma aliada, porém reconhece as desvantagens. 

“Vejo [a internet] como algo aproximador. Você não tem só o tempo de encontros pessoais, e quando cada um vai pra sua casa, ainda continuam conversando. Mas, acho que as amizades funcionam só quando têm a internet como uma ferramenta que aproxima. Se for para formar amizade só pela internet, é diferente, porque aí cada um pode se esconder em um personagem que não é na vida real”, explica.

Internet como aliada

Algumas amizades surgem na época do colégio, e mesmo que a universidade possa significar uma divergência de caminhos e trazer uma certa distância, ainda permanecem firmes e fortes. Estefany Uchoa, aluna do 7º semestre do curso de Direito da Unifor, e Júlia Feitosa, acadêmica do 6º semestre do curso de Medicina, são a prova disso. A dupla se conheceu no início do ensino médio, e com a loucura do dia a dia universitário, o contato era feito por WhatsApp e encontros anuais. 

Por já estarem acostumadas a manter contato por meio das redes sociais, a pandemia serviu para aproximar ainda mais as duas. “Acredito que a pandemia influenciou para mantermos contato com pessoas que sentimos confiança e nos transmitem tranquilidade, então a gente se falava com uma maior frequência”, conta a futura bacharel em Direito. Feitosa explica que uma dava suporte para a outra e se mostravam ainda mais disponíveis em um momento atípico para todos.

Por falar em internet e redes sociais, as duas amigas compartilham da mesma opinião. Estefany acredita que as mídias facilitam a construção das amizades, atuando como aliadas dos relacionamentos, já que se apresentam como uma oportunidade de estar presente na vida da outra pessoa e manter o contato direto. 

Júlia concorda: “[a internet] faz com que você fique próxima de pessoas que, infelizmente, você não consegue ver rotineiramente devido a compromissos. Também acredito que uma amizade não é mais profunda do que outra por uma ser mais virtual e outra mais presencial. Para mim, depende de como você se dedica às suas amizades”.

Ainda que já estejam mais do que familiarizadas com a tecnologia e suas facilidades, a vontade de criar novos laços no presencial ainda se faz presente para as duas estudantes, e é isso que ambas esperam com o retorno ao presencial. “Espero que as pessoas estejam com a mente aberta para amizades após tanto tempo em aulas virtuais e sem tanto contato com outras pessoas”, deseja a futura médica.

A importância da amizade 

A relação de amizade pode ter diversas facetas. Não existe um jeito certo de ser amigo, ou um livro com regras a serem seguidas. Todas as pessoas procuram por coisas diferentes para suas vidas e ciclos de relacionamento, e tendem a se aproximar daquelas que conseguem enxergar uma compatibilidade. “Podemos perceber a amizade como uma forma de interação entre as pessoas, constituída através da escolha livre dos sujeitos, gerando intimidade e reciprocidade”, pontua Ana Rebeca.

A psicóloga explica que essa interação também apresenta funções que perpassam a promoção de segurança e afeto, além da facilitação de processos de aprendizagem. Assim, ainda que a amizade seja viabilizadora de momentos de troca de afeto, sua importância vai muito além disso, contribuindo para o desenvolvimento de habilidades emocionais, como o senso de cooperação, resolução de conflitos, responsabilidade afetiva, empatia e muitos outros. 

Para Carlos José, um amigo é aquela pessoa verdadeira, que vai estar presente nos piores e melhores momentos, e Matheus complementa: “com ela [a amizade], a gente consegue se colocar no lugar do outro, consegue se abrir, ter alguém que te compreenda e não só concorde contigo, mas também alguém que questione suas atitudes e escolhas”

Estefany explica que, para ela, a amizade é a retratação de que ninguém vive sozinho. “Nós precisamos uns dos outros e temos a necessidade de ter relacionamentos. Muitas vezes, os amigos são como família, nos ensinam valores e lições importantes”. Já Júlia diz que amizade é saber com quem você pode contar a toda hora, além de dar risadas, compartilhar novos momentos e criar memórias. 

Kamylle afirma que a amizade é uma extensão da família, além de ser um dos laços mais importantes da vida. É sinônimo de confiança, apoio e presença. Ela acredita que ninguém precisa viver sozinho e se restringir, e que o contato com o outro é algo essencial. “É uma relação que você rega, e se você regar direitinho, você leva aquilo para todo o sempre”, afirma. Bianca finaliza: “na minha visão, a amizade é importante não só como uma fonte de diversão, mas também como uma força aliada, que torce e luta ao nosso lado em prol de nosso avanço e evolução, assim como nós por eles”.