Entrevista Nota 10: Felipe Neri e o trabalho de preparação vocal com celebridades

seg, 14 abril 2025 19:32

Entrevista Nota 10: Felipe Neri e o trabalho de preparação vocal com celebridades

Especialista em Voz fala sobre a importância do acompanhamento fonoaudiológico para profissionais da música, assim como o mercado de trabalho na área e sua experiência de formação na Unifor


Felipe atua no aprimoramento vocal de artistas renomados como Xand Avião, Zé Vaqueiro e Henry Freitas (Foto: Arquivo pessoal)
Felipe atua no aprimoramento vocal de artistas renomados como Xand Avião, Zé Vaqueiro e Henry Freitas (Foto: Arquivo pessoal)

Além de ser uma das principais formas de comunicação, a voz também é ferramenta de trabalho para diferentes tipos de profissionais. No mundo da música, cantores de diversos estilos precisam seguir rotinas intensas de apresentações, o que exige tanto preparo para entregar uma boa performance quanto cuidados especiais para prevenir possíveis prejuízos vocais.

E é nesse cenário que o acompanhamento fonoaudiológico se faz essencial. “O fonoaudiólogo necessita acompanhar esse cantor justamente para prevenir as alterações que possam acometê-lo e garantir uma qualidade vocal na entrega daquele show ou nas entregas daqueles shows no mês”, explica o fonoaudiólogo Felipe Ferreira Neri.

Pós-graduado em Voz - Canto e Fala e mestre em Saúde Coletiva pela Universidade de Fortaleza, ele atua na habilitação, reabilitação e condicionamento vocal junto a cantores de alta performance, como Xand Avião, Zé Vaqueiro e Henry Freitas. O profissional de fonoaudiologia posta em suas redes sociais o trabalho de preparação vocal junto às celebridades.

No mês de março, ele esteve na Unifor para um momento especial com os alunos do curso de Fonoaudiologia, do qual é egresso. Após ministrar a palestra “A importância da Fonoaudiologia no acompanhamento de cantores de alta performance: mercado de trabalho e desafios”, Felipe conversou com os futuros profissionais da área e compartilhou experiências sobre o mercado de trabalho.

Na Entrevista Nota 10 desta semana, ele fala sobre a importância da fonoaudiologia na preparação e preservação da voz de profissionais da música, assim como o mercado de trabalho na área e a sua experiência de formação na Unifor.

Confira na íntegra a seguir.

Entrevista Nota 10 — De que maneira você enxerga a importância da fonoaudiologia na preparação e preservação da voz de artistas e profissionais da música? Quais são os desafios e as oportunidades desse mercado de trabalho hoje no Brasil?

Felipe Neri — Se formos parar para analisar, o cantor é um dos profissionais da voz que tem uma alta demanda vocal, ou seja, o uso funcional da voz intenso por pelo menos uma hora e meia, que é o tempo médio do show. E associado a isso, a quantidade de shows dentro de uma agenda. Temos cantores aqui no Brasil que fazem dois shows por noite, no mínimo. Tem show todo dia na semana e pouco tempo de descanso. Isso abre muito precedente para o surgimento de alterações vocais, de patologias vocais. Então, o fonoaudiólogo necessita acompanhar esse cantor justamente para prevenir as alterações que possam acometê-lo e garantir uma qualidade vocal na entrega daquele show ou nas entregas daqueles shows no mês.

Hoje, o mercado de trabalho se abriu muito para nós, enquanto fonoaudiólogos, que fazemos esse tipo de acompanhamento. Muito se quer ter uma voz saudável, uma voz perfeita. Os cantores estão nessa busca intensa de melhoria do seu show, da sua performance. [Isso abre] espaço para que nós possamos entrar e nos fixar ali.

Um dos grandes desafios que eu sinto enquanto profissional é o ambiente. São as adversidades que encontramos naquele ambiente que fogem do nosso controle, diferente do consultório. No consultório, temos um ambiente controlado, temperatura, questão do ruído. E se a formos parar para pensar, o camarim tem ruído, às vezes fica no trio elétrico. Então, você precisa fazer adaptações para que seu atendimento não perca a qualidade e garanta a saúde vocal daquele profissional.

Entrevista Nota 10 — Você trabalha com nomes como Xand Avião, Zé Vaqueiro e Henry Freitas, artistas de alta performance. Como foi o processo de inserção no meio artístico, especialmente junto a grandes celebridades? Você tem dicas para quem busca explorar essa área de atuação?

Felipe Neri — Não tem como eu falar da minha trajetória profissional e do meu processo de inserção nesse meio sem citar o nome de uma pessoa a quem eu sou muito grato, tenho um carinho imenso, que é a doutora Vanessa Cláudia, também fonoaudióloga. Ela foi minha professora na Universidade de Fortaleza, minha orientadora no trabalho de conclusão de curso e é minha eterna mentora profissional e de vida. Ela quem sempre observou em mim o brilho enquanto eu ainda era aluno dela e sempre me instigou a querer mais e mais — até hoje ela me instiga a isso durante os momentos de troca, de debate sobre alguns acompanhamentos que realizamos. Era justamente ela quem tinha a cartela de artistas, então ela conseguiu me preparar, me moldar para esse tipo de atendimento, especificamente com esse público.

A principal dica que eu dou para quem quer se inserir nesse meio é justamente alinhar o conhecimento científico, muito bem fundamentado, junto da ética e da responsabilidade e entender o impacto que eu vou ter naquela ferramenta de trabalho e, principalmente, na vida daquele profissional que eu vou estar acompanhando.

Entrevista Nota 10 — Como você adapta as orientações vocais diante de estilos musicais distintos e de rotinas de apresentações intensas? Existem especificidades nos tipos de artista que você atende e que influenciam o trabalho de preparação e prevenção vocal junto aos pacientes?

Felipe Neri — Hoje, meu nicho de atuação, meu público, é forró, é bem específico. Mas a gente sabe, quem trabalha com canto, que cada estilo musical tem uma particularidade, tem uma singularidade que os diferencia dos demais. Por exemplo, o rock tem características vocais, tem ajustes vocais e corporais diferentes do sertanejo, diferentes do samba. E nós, como fonoaudiólogos, precisamos identificar essas características, potencializá-las, dando saúde e qualidade vocal para esses cantores para que eles não se machuquem durante as apresentações.

Entrevista Nota 10 — Em março, você esteve no curso de Fonoaudiologia da Unifor para ministrar um momento especial aos alunos, onde compartilhou experiências e dicas sobre a profissão, especialmente no acompanhamento de cantores de alta performance. Poderia contar como foi o evento? Qual a importância de oportunidades como essa para formação desses novos profissionais?

Felipe Neri — Nossa, eu acho que aquele momento foi uma troca riquíssima, inenarrável, inexplicável, porque eu via o brilho no olhar daqueles alunos e eu conseguia me enxergar. Eu fiz um retrocesso da minha trajetória e me via ali quando eu comecei. E por que é muito importante? Porque aquela figura que está ali mostrando o seu dia-a-dia, mostrando a sua trajetória, como conseguiu alcançar o seu objetivo, o que você tanto queria, foi possível e serve de esperança, e serve de impulso, e serve de exemplo. Acho que a palavra maior é exemplo. E eu fico muito feliz e honrado em participar desse momento e ser exemplo desses meninos.

Entrevista Nota 10 — Você iniciou sua trajetória no ramo de fonoaudiologia durante sua graduação na Unifor. Como foi sua experiência na Universidade? Quais diferenciais do curso foram essenciais para a construção da sua carreira, especialmente no trabalho com voz profissional?

Felipe Neri — Digo para todo mundo que eu sou um eterno aluno da Universidade de Fortaleza, um eterno apaixonado pela Universidade. Tanto que, quando eu me formei, foi como cortar o cordão umbilical. E em menos de dois meses, eu voltei para fazer o mestrado lá também, porque eu precisava estar ali naquele campus, eu precisava me sentir como aluno da Unifor de novo. Minha trajetória na graduação foi maravilhosa, fantástica.

O grande diferencial para mim no atendimento com esse público de voz profissional foi o estágio voluntário que eu realizei no Núcleo de Atenção Médica Integrada (NAMI), no Ambulatório de Fonoaudiologia. Eu era estagiário do Tiago Aguiar, que é o fonoaudiólogo desse ambulatório, e lá, uma das grandes demandas que ele atendia era de cantores. Durante os atendimentos, existia sempre essa troca, questionamentos dele, incentivo, “vai Filipe, você consegue, vai atender”, orientações de como atender. Então, esse estágio me abriu a mente sobre o fazer da fonoaudiologia junto a esse tipo de profissional, junto aos cantores.

Entrevista Nota 10 — Além da graduação, você também realizou o Mestrado em Saúde Coletiva pela Pós-Unifor. De que maneira essa pós-graduação encorpou sua atuação profissional e te deu novas perspectivas sobre a fonoaudiologia? O que você destacaria como diferenciais importantes do curso para sua formação?

Felipe Neri — Fiz mestrado em Saúde Coletiva pela Universidade de Fortaleza, fui orientando da professora Christina Praça, por quem eu também tenho enorme carinho e gratidão por tudo. Além de me dar a possibilidade de ensinar, de falar para o outro aquilo que eu faço na minha vida cotidiana, no meu dia a dia — claro que pautado e muito bem fundamentado na ciência —, me permitiu também a sensibilidade de ouvir o outro, de entender a dor do outro. E eu acho que isso é uma característica muito importante para um excelente profissional.

Ainda que o meu público de direcionamento da minha pesquisa tenha sido outro — a minha pesquisa foi realizada com voz, mas do professor, que talvez dentre os profissionais da voz seja o que mais sofre de alterações vocais e que mais necessite de um olhar profissional para eles —, é muito lindo como o conhecimento é poder. Então, você dar conhecimento para esses profissionais, você empoderar esses profissionais para que possam cuidar de si mesmos é fantástico, a sensibilidade é incrível, e uma sensação também incrível.