O que é o Imposto sobre Operações Financeiras e como ele afeta o bolso do brasileiro?

seg, 23 junho 2025 13:35

O que é o Imposto sobre Operações Financeiras e como ele afeta o bolso do brasileiro?

Professor da Universidade de Fortaleza explica os impactos para consumidores e empresas da nova Medida Provisória que reajusta alíquotas e amplia incidência do IOF em transações cotidianas


No Brasil, o valor da alíquota única é de 17,5% de Imposto de Renda sobre os rendimentos de aplicações financeiras (Foto: Getty Images)
No Brasil, o valor da alíquota única é de 17,5% de Imposto de Renda sobre os rendimentos de aplicações financeiras (Foto: Getty Images)

Se você já fez uma compra internacional, precisou trocar moedas para viajar ou contratou um empréstimo em uma instituição financeira, provavelmente já se deparou com a sigla IOF. Mas por que é cobrada uma taxa sobre essas operações? Embora muitas vezes passe despercebido, o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) está mais presente em nosso dia a dia do que se imagina e pode influenciar diretamente nas finanças pessoais.

Conversamos com o economista Marcelo Lamas, professor do curso de Ciências Econômicas da Universidade de Fortaleza — instituição mantida pela Fundação Edson Queiroz —, para entender melhor o que é o IOF, como ele funciona e de que forma pode afetar o bolso dos cidadãos brasileiros.

O que é IOF?

Marcelo explica que o IOF é um tributo federal que incide sobre uma ampla gama de transações financeiras realizadas por pessoas físicas e jurídicas. “Ele está presente em operações como empréstimos, câmbio, seguros e em alguns tipos de investimentos, especialmente os de curto prazo”, explica Marcelo.

Ou seja, sempre que alguém realiza uma dessas operações, acaba pagando o imposto automaticamente, muitas vezes sem perceber. A cobrança é feita diretamente na fonte e varia de acordo com o tipo de transação.

Um exemplo comum citado pelo professor é o uso do cartão de crédito em compras internacionais. “Mesmo sendo um serviço digital, como a assinatura do ChatGPT, o pagamento é feito em dólar. O banco converte o valor e aplica o IOF automaticamente na fatura”, afirma o economista. 

Situações como essa mostram como o imposto está presente no cotidiano financeiro da maioria das pessoas, desde a aquisição de moeda estrangeira para uma viagem até o financiamento de um seguro. Segundo Marcelo, compreender como o IOF funciona é essencial para planejar melhor os gastos e evitar surpresas no orçamento.

Nova Medida Provisória quer alterar o IOF

Nas últimas semanas, a discussão sobre o IOF esteve em alta em razão do decreto que altera as regras sobre a taxação. O mercado financeiro e uma extensa parcela de políticos reagiram negativamente ao anúncio do governo federal, o que levou a Câmara dos Deputados a aprovar regime de urgência para votação sobre a Medida Provisória (MP).

Segundo o professor Marcelo, a recente MP traz mudanças significativas com foco na harmonização tributária, na justiça fiscal e no aumento da arrecadação. Entre os principais pontos está a introdução de uma nova alíquota de 5% sobre aportes mensais acima de R$ 50 mil em planos de previdência privada com cláusula de sobrevivência, do tipo Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL). 

A medida fecha brechas que vinham sendo utilizadas por pessoas de alta renda para escapar da tributação, usando esses planos como forma de investimento com carga tributária reduzida”, explica Marcelo.

Outro destaque é a uniformização das alíquotas no crédito para empresas. A alíquota efetiva, que antes era até 1,88% ao ano, foi elevada para 3,95%, equiparando a carga tributária das pessoas jurídicas à das físicas. “Essa mudança busca eliminar distorções e tornar o sistema mais neutro”, afirma o professor. 


Segundo o Serasa, a alíquota é um percentual usado para calcular o valor final de um imposto que deve ser pago por uma pessoa física ou jurídica (Ilustração: Getty Images)

No caso das empresas do Simples Nacional (tributação simplificada para micro e pequenas empresas), o teto subiu de 0,88% para 1,95% ao ano, enquanto os Microempreendedores Individuais (MEI) passaram a ter assegurado o direito às menores alíquotas, as mesmas aplicadas a pessoas físicas. Já no câmbio de moedas estrangeiras, as operações passaram a ter uma alíquota unificada de 3,5%, abrangendo cartões de crédito internacionais, pré-pagos, remessas ao exterior e compra de moeda em espécie.

A volta da tributação sobre empréstimos externos de curto prazo, com alíquota de 3,5%, também se destaca. De acordo com estimativas da Receita Federal, as mudanças podem elevar a arrecadação em R$ 20,5 bilhões já em 2025, chegando a R$ 41 bilhões em 2026.

Mas como essa MP impacta diretamente o bolso do cidadão?

O impacto mais direto dessas mudanças está no aumento do custo de operações cotidianas relacionadas ao consumo internacional. “Compras com cartão de crédito ou débito internacional, aquisição de moeda estrangeira, remessas para fora do país e até assinaturas digitais, como plataformas de streaming ou serviços como o ChatGPT, ficam mais caras com a alíquota unificada de 3,5%”, detalha Marcelo Lamas.

Embora a porcentagem possa parecer pequena, como o IOF é proporcional ao valor da operação, ele acaba pesando proporcionalmente mais no orçamento de quem tem renda mais baixa. Isso agrava a regressividade do sistema tributário, tornando-o ainda menos justo.

Além do consumidor, setores produtivos também sentirão os reflexos. As novas alíquotas afetam diretamente empresas que operam com importação e exportação, já que boa parte dessas transações envolve câmbio. “Isso pode elevar o custo de insumos e serviços contratados no exterior, com efeito indireto sobre os preços finais dos produtos e sobre a competitividade da indústria nacional”, destaca o economista.


Produtos e serviços que dependem da importação de insumos serão afetados com as novas medidas do IOF, o que pode influenciar o preço final para os consumidores (Foto: Getty Images)

O transporte internacional de cargas, por exemplo, também será impactado, pois envolve pagamentos a empresas estrangeiras. Isso, por sua vez, pode encarecer o frete, pressionar os preços ao consumidor e afetar a logística de empresas que dependem do comércio exterior. 

Já a tributação sobre aportes elevados em previdência privada — acima de R$ 600 mil por ano —, a partir de 2026, atinge uma parcela mais rica da população, com a justificativa de combater distorções no uso desses produtos como mecanismos de proteção fiscal.

Impactos macroeconômicos e limites como estímulo fiscal

No cenário macroeconômico, as mudanças no IOF também devem provocar efeitos relevantes. Entre os principais impactos esperados estão a redução no consumo de serviços internacionais, uma possível desaceleração em operações de crédito corporativo e o aumento dos custos para empresas exportadoras e importadoras.

“A depender da sensibilidade dos preços e dos repasses ao consumidor, pode haver alguma pressão inflacionária, sobretudo por meio do encarecimento de fretes e insumos importados. Ainda assim, esse efeito tende a ser pontual e restrito a alguns setores”, avalia o professor.

Embora o governo tenha justificado a Medida Provisória como forma de ampliar a arrecadação e promover maior justiça fiscal, Marcelo Lamas pondera que seus efeitos, como o estímulo à economia, são bastante limitados.


“A medida é parcialmente válida do ponto de vista fiscal, pois contribui com o ajuste das contas públicas e corrige distorções que favoreciam grandes investidores. No entanto, como estímulo econômico, os efeitos são nulos ou até negativos, já que o aumento de impostos tende a desestimular o consumo e elevar custos operacionais”Marcelo Lamas, professor do curso de Ciências Econômicas da Unifor e mestre em Economia

A eficiência da medida, segundo ele, é parcial. Embora ela contribua para elevar a arrecadação no curto prazo, faz parte de uma estratégia de política fiscal contracionista, cujo objetivo é conter a demanda agregada e contribuir para a convergência da inflação à meta, especialmente em um cenário de juros elevados.

“No entanto, um ajuste fiscal mais sólido exigiria controle firme dos gastos públicos e uma revisão estrutural das despesas obrigatórias. Aumentar o IOF pode funcionar temporariamente, mas não substitui reformas fiscais mais amplas voltadas à sustentabilidade das contas públicas”, conclui.