null Itinerância da 34ª Bienal de São Paulo chega ao Espaço Cultural Unifor

Qua, 24 Agosto 2022 10:52

Itinerância da 34ª Bienal de São Paulo chega ao Espaço Cultural Unifor

Exposição será aberta no dia 6 de setembro e segue até 4 de dezembro. Programa de mostras itinerantes leva recortes da mostra a cidades no Brasil e exterior


Visita mediada durante a abertura da itinerância da 34ª Bienal de São Paulo no Centro Cultural Vale Maranhão, em São Luís, 2022 (Foto: Jesús Pérez Chuseto / Fundação Bienal de São Paulo)
Visita mediada durante a abertura da itinerância da 34ª Bienal de São Paulo no Centro Cultural Vale Maranhão, em São Luís, 2022 (Foto: Jesús Pérez Chuseto / Fundação Bienal de São Paulo)

Fortaleza é a próxima cidade a receber exposição itinerante da 34ª Bienal de São Paulo – Faz escuro mas eu canto, com abertura no dia 6 de setembro, no Espaço Cultural Unifor. A exposição segue até 4 de dezembro na cidade, e foi viabilizada por meio de parceria da Fundação Bienal de São Paulo com a Fundação Edson Queiroz, mantenedora da Universidade de Fortaleza (Unifor). A visitação é gratuita.

Para 2022, as mostras itinerantes da 34ª Bienal de São Paulo foram concebidas a partir de enunciados que são objetos ou elementos imateriais com histórias marcantes ao redor dos quais obras e artistas são reunidos, estimulando leituras a partir de narrativas e não de formulações conceituais fechadas.

“A Fundação Edson Queiroz e o Espaço Cultural Unifor recebem com muita satisfação a exposição itinerante da 34ª Bienal de São Paulo – Faz escuro mas eu canto. Para nós, é uma grande realização sermos um dos viabilizadores para trazer ao Ceará essa mostra que simboliza a diversidade de vozes e reafirma o lugar da arte como ponto de encontro e de diálogo”, ressalta a presidente da Fundação Edson Queiroz, Lenise Queiroz Rocha.

“Esta exposição é fruto da parceria entre a Fundação Edson Queiroz e a Fundação Bienal de São Paulo, instituições que têm em comum a missão de democratizar o acesso à cultura e fomentar o interesse pela criação artística, sempre permeada por forte viés educativo. Certamente, os trabalhos aqui expostos no Espaço Cultural Unifor vão inspirar reflexões e debates produtivos junto à nossa comunidade acadêmica e aos demais visitantes”, destaca, por sua vez, o professor Randal Pompeu, vice-reitor de Extensão e Comunidade Universitária da Unifor.

Na capital cearense, a exposição será organizada a partir de três enunciados: Cantos Tikmũ’ũn, A imagem gravada de Coatlicue e Hiroshima mon amour de Alain Resnais, e terá trabalhos dos seguintes artistas: Alice Shintani, Daiara Tukano, E.B. Itso, Frida Orupabo, Gala Porras-Kim, Gustavo Caboco, Jaider Esbell, Jungjin Lee, Melvin Moti e Victor Anicet.

Os Tikmũ’ũn, também conhecidos como Maxakali, são um povo indígena originário de uma região compreendida entre os atuais estados de Minas Gerais, Bahia e Espírito Santo. Após inúmeros episódios de violências e abusos, os Tikmũ’ũn chegaram a beirar a extinção nos anos 1940 e foram forçados a abandonar suas terras ancestrais para sobreviver. Os cantos organizam a vida nas aldeias, constituindo quase um índice de todos os elementos que estão presentes em seu cotidiano – plantas, animais, lugares, objetos, saberes – e envolvendo sua rica cosmologia. Grande parte desses cantos, muitas vezes destinados à cura, é executada coletivamente.

No contexto de uma exposição concebida ao redor da necessidade e do poder do canto, tanto num sentido literal quanto metafórico, o exemplo dos Tikmũ’ũn ressoa de modo potente, inclusive do ponto de vista político: em sua prática, o esforço comunitário é constantemente renovado para nomear e assim construir coletivamente um universo. Na itinerância da 34ª Bienal de São Paulo, ao redor desse enunciado agrupam-se obras que têm entre seus disparadores reflexões sobre a necessidade de preservação do meio ambiente e de salvaguarda de culturas e conhecimentos que são transmitidos oralmente de geração em geração, como os próprios cantos Tikmũ’ũn.

Em 13 de agosto de 1790, um grupo de trabalhadores que fazia escavações na Praça Central da Cidade do México descobriu uma estátua, retratada e identificada pelo astrônomo e antropólogo Antonio de León y Gama como Teoyaomiqui. Na verdade, era a deusa Coatlicue, também conhecida como Dama de la Falda de Serpientes [Senhora da saia de serpentes]. Na mitologia asteca, Coatlicue, padroeira da vida e da morte, era a mãe de Huitzilopochtli, deus da terra, e representava a fertilidade.

A descoberta ocorreu durante as obras de construção de um canal de água para abastecer a cidade colonial, erguida sobre a grande Tenochtitlán, antiga capital asteca. Em 1520, quando as hordas espanholas lideradas por Hernán Cortez entraram na cidade, gradualmente subjugando e aniquilando uma das urbes mais prósperas de toda a Mesoamérica, dentre as estratégias utilizadas para desmantelar o império asteca esteve a eliminação de seus símbolos e crenças através da invisibilização e da substituição de imagens e tradições antigas.

O vice-rei Revillagigedo ordenou que Coatlicue fosse levada para a Universidade Real e Pontifícia do México como uma relíquia do passado mesoamericano. Mas, depois de algumas deliberações, as autoridades espanholas decidiram enterrá-la novamente, suspeitando que a senhora da saia de serpentes pudesse desencadear uma revolução. Enterraram-na sob o claustro da universidade, até que, em 1804, um curioso Alexander von Humboldt pediu para vê-la durante sua visita à Nova Espanha. As crônicas narram que o explorador alemão começou a desenhá-la sem, no entanto, completar a ilustração: os religiosos da universidade tornaram a escondê-la sob a terra, talvez temendo que seu poder se tornasse incontrolável, e Humboldt teve que soltar as rédeas de sua imaginação para imortalizar a aura poderosa de Coatlicue em seus esboços.

O que há, de fato, para ver e para entender naquilo que sobrevive às tragédias, aos extermínios de populações e culturas? Diante do trauma inenarrável, o que podem contar um museu, um monumento, uma ruína ou uma cicatriz? “As reconstruções, por falta de outra coisa”, “As explicações, por falta de outra coisa”, “As fotografias, por falta de outra coisa”, diz Ela, a protagonista (francesa) de Hiroshima mon amour, o clássico dirigido por Alain Resnais em 1959, na sequência inicial do filme. Ela se refere ao que encontrou em Hiroshima quase quinze anos após o bombardeamento que vitimou mais de 160 mil pessoas, mas poderia falar também daquilo que é encontrado por quem visita os campos de concentração nazistas, ou mesmo os museus repletos de despojos da colonização. Mas os objetos, as fotografias, as explicações, as reconstruções não são suficientes para entender. Hiroshima mon amour não busca explicar, nem reconstruir, mas apalpar a opacidade e a intraduzibilidade do testemunho.

Como Ela, às vezes nos esforçamos por entender, procuramos nos aproximar de todas as formas possíveis, por todos os ângulos: lemos as explicações, visitamos os destroços, olhamos de novo cada fotografia velha. Mas não. É impossível conhecer Hiroshima, como é impossível compreender outros atos de extrema violência de que é feita nossa história. Nunca poderemos sentir a temperatura do sol sobre a Praça da Paz, mas podemos tentar nos aproximar do indizível, tentar dar forma àquilo que não pode ter nome. A arte é, também, um desses caminhos pelos quais se busca cercar o incompreensível, não o reduzir a explicações, mas dar-lhe contorno, desenhar o alcance daquilo que irradia. Porque a tradução, embora impossível, é, ainda assim, necessária; porque nesse esforço falido aprendemos sobre nossos desejos e medos – o medo que dá não saber, não chegar a entender, ou o medo de nos sabermos capazes de atos que nunca poderemos compreender.

Na itinerância da 34ª Bienal de São Paulo, ao redor desses dois enunciados agrupam-se obras que dialogam com questões como alteridade e opacidade – sendo este último um conceito do autor Édouard Glissant, uma das referências teóricas desta edição da mostra.

Sobre o programa de mostras itinerantes da Bienal de São Paulo

O programa de mostras itinerantes da Bienal de São Paulo é uma iniciativa que chega em 2022 à sua sexta edição. A itinerância da 33ª Bienal, em 2019, percorreu oito cidades, sendo uma no exterior, e recebeu um público de mais de 170 mil visitantes.

“O programa aposta na arte e no seu impacto positivo no campo da educação e da cidadania. Parcerias com as instituições em cada local permitem a difusão do trabalho para além do circuito artístico da cidade de São Paulo, chegando a outros olhares e novas sensibilidades. Além das exposições, a iniciativa inclui ações educativas e de difusão, estando alinhada à missão da Fundação de integrar cultura e educação à vida cotidiana”, afirma José Olympio da Veiga Pereira, presidente da Fundação Bienal de São Paulo.

Pela iniciativa, além de São Luís (MA), Campinas (SP), São José do Rio Preto (SP), Campos do Jordão (SP), Belo Horizonte (BH) e Fortaleza (CE), outras cidades brasileiras e do exterior estão previstas para receber recortes da 34ª Bienal este ano, são elas: Brasília (DF), Belém (PA), Rio de Janeiro (RJ), Santiago (Chile) e Arles (França).

Serviço

34ª Bienal de São Paulo – Faz escuro mas eu canto
Abertura: 6 de setembro de 2022, às 19h
Período expositivo: de 7 de setembro a 4 de dezembro de 2022
Visitação: de terça a sexta-feira, de 9h às 19h, e sábado, domingo e feriados, de 10h às 18h
Local: Espaço Cultural Unifor (Av. Washington Soares, 1321 - Edson Queiroz)
Entrada gratuita e aberta ao público
Mais informações: (85) 3477.3319