seg, 25 novembro 2024 14:48
Entrevista Nota 10: Wagner Belo e a internacionalização das universidades brasileiras
Coordenador de Relações Internacionais do Instituto Federal de São Paulo fala sobre o panorama dos programas de educação internacional nas universidades brasileiras
A internacionalização tem se consolidado como uma estratégia de destaque nas universidades, visando ampliar a cooperação acadêmica, a mobilidade estudantil e a inserção em redes globais de conhecimento. Instituições de ensino superior (IES) no Brasil, por exemplo, têm implementado programas que facilitam o intercâmbio de estudantes e docentes, além de firmar parcerias com universidades estrangeiras para projetos de pesquisa colaborativos.
Com isso em vista, a Universidade de Fortaleza — mantida pela Fundação Edson Queiroz — já se dedica a esse processo há mais de duas décadas. Além dos diversos programas e parcerias na graduação, na pós-graduação e na pesquisa com IES de vários países, eventos como a Semana da Internacionalização buscam apresentar à comunidade universitária iniciativas de internacionalização que permeiam os setores acadêmicos da Unifor.
Em sua primeira edição, a Semana contou com uma programação repleta de ações culturais, exposições, mesas-redondas, painéis e debates, evidenciando as parcerias globais da Unifor e a experiência internacional de docentes e alunos. Um dos nomes de destaque que participou do momento foi Wagner Belo, coordenador de Relações Internacionais e professor do Instituto Federal de São Paulo (IFSP), que ministrou a palestra “Internacionalização como Instrumento de Potencialização das Capacidades Institucionais”.
Belo já atuou como gestor de relações internacionais e coordenador de projetos no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sudeste de Minas Gerais (IF Sudeste MG) e no Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (Cefet/RJ). Também integrou o Grupo de Trabalho de Políticas de Internacionalização no Ministério de Educação, dentro da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (SETEC/MEC), em Brasília.
Nos últimos anos, o docente tem se dedicado ao desenvolvimento de estratégias de inserção da internacionalização no contexto da educação profissional e tecnológica e na mensuração dos impactos alcançados pela pasta. Durante os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, em 2016, foi coordenador de voluntários internacionais, além de ter atuado como tradutor trilíngue nas competições oficiais.
Na Entrevista Nota 10 desta semana, Wagner fala sobre o panorama dos programas de educação internacional nas universidades brasileiras e pontua a importância da internacionalização do ensino.
Confira na íntegra a seguir.
Entrevista Nota 10 — Como está a aplicação de programas de educação internacional no Brasil?
Wagner Belo — Hoje estamos, na verdade, ainda começando a considerar essa possibilidade, porque o Brasil, muito recentemente, descobriu as potencialidades da internacionalização. A educação internacional no Brasil é uma temática que as instituições de ensino brasileiras já entenderam que não dá para não participar, mas ainda estamos num processo embrionário de estruturação dessa proposta, sobretudo, o entendimento do que significa, de fato, a pasta internacional dentro de instituições de ensino.
Vamos falar dos últimos 20 anos, mas o grande potencializador começa com o Programa Ciências Sem Fronteiras, no ano de 2011. De lá para cá, essas ações se mostram de maneiras mais marcadas e mais potentes.
Entrevista Nota 10 — Como o senhor avalia os programas de educação internacional voltados para os professores de universidades no Brasil? Dentre os programas que conhece, qual aquele que o senhor aponta como um modelo a ser seguido? E por quê?
Wagner Belo — Eu acho que, muitas das vezes, trabalhamos ainda com um conceito muito superficial do que é internacionalização. Antes de pensarmos na promoção de ações, temos que entender a realidade nacional e a realidade das instituições. Primeiro faz-se o mapeamento para depois fazer ações que sejam aderentes à realidade institucional. Então, em vez de olharmos apenas para fora, temos que olhar para a estrutura da própria instituição para entender como aquilo impacta na nossa realidade, como a internacionalização vem agregar valores para as nossas práticas institucionais.
Existem algumas instituições que já têm uma pasta internacional muito consolidada. Das privadas, por exemplo, podemos destacar a Universidade de Caxias do Sul, a PUC Rio de Janeiro, Mackenzie, a FAAP. Algumas instituições já têm programas bem consolidados, e sem contar com as públicas. Por exemplo, a USP, a UFRJ e [outras] grandes universidades também têm programas muito consolidados de internacionalização e educação internacional.
Entrevista Nota 10 — Muito se tem falado nos últimos anos na internacionalização da educação no Brasil. Inclusive, o senhor integrou o Grupo de Trabalho de Políticas de Internacionalização no Ministério de Educação dentro da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica, em Brasília. Quais os principais resultados desse grupo de trabalho e o que precisa ser feito para atualizar essas políticas?
Wagner Belo — Primeiro, entender que a internacionalização não é mobilidade e a nossa função é muito destoante de uma agência de turismo. A partir daí, começamos a discutir teoricamente e conceitualmente como a internacionalização conectada com a realidade institucional é capaz de agregar valor. Acho que uma das grandes contribuições é entender os desdobramentos da parte internacional. Segundo, entender também quais são os desafios que temos e precisamos reconhecer e nos debruçar sobre eles.
Então, creio que uma das grandes contribuições é entender que a internacionalização não é um modelo pronto, é um modelo que precisa ser customizado e adaptado à nossa realidade e ver como isso consegue se agregar às nossas demandas e perspectivas futuras.
Entrevista Nota 10 — Como o senhor avalia o envolvimento do Ministério da Educação no aperfeiçoamento das políticas de internacionalização entre as universidades públicas e privadas? Há estímulo governamental para isso? Caso positivo, ele é suficiente? O que o governo deveria fazer e que não faz para ampliar e até fortalecer essas políticas?
Wagner Belo — O Ministério da Educação ainda não consegue entender quais são os grandes desdobramentos. Então, precisa, sim, de um esforço por parte dos governantes de entender quais são as grandes atribuições do setor internacional. Hoje, vemos que o Ministério da Educação ainda não consegue entender a complexidade e a potencialidade que pode ser aventada a partir de uma estruturação bem planejada e desenvolvida. O Ministério precisa fazer esse dever de casa, ele não está fazendo.
Existe uma tentativa [no Brasil de sensibilizar o Ministério da Educação], só que o Ministério tem questões tão urgentes relacionadas à educação básica e outras questões que acaba não conseguindo dedicar tanta atenção ao setor internacional. Mas ele precisa pensar que se o país quer se desenvolver de forma sustentável e impactante no cenário internacional, a questão da internacionalização do ensino superior precisa ser considerada com mais cuidado por parte do Ministério. E hoje entendemos que esse cuidado não é tão marcante.
Entrevista Nota 10 — Você coordenou a equipe de voluntários internacionais nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro 2016. Qual a importância e o papel dos projetos de voluntariado das instituições de ensino superior no processo de internacionalização acadêmica? E o que pode ser feito para aperfeiçoá-los?
Wagner Belo — O desenvolvimento de projetos de diversas naturezas vai deixar lastros e impactos muito marcados na instituição. Então, o que recomendamos é desenvolvimento de ações concretas envolvendo ensino, pesquisa e extensão e toda a comunidade acadêmica em projetos. Esse das Olimpíadas foi apenas um deles, mas hoje, lá na minha instituição, desenvolvemos 64 projetos internacionais. E essas iniciativas têm gerado resultados muito concretos. Então, nossa grande recomendação é: desenvolva projetos, ações concretas, não fique na panfletagem.
Entrevista Nota 10 — O senhor está participando da Semana de Internacionalização da Universidade de Fortaleza. Como avalia a importância de eventos dessa natureza para o fortalecimento de políticas de educação internacional no Brasil?
Wagner Belo — É fundamental fazermos eventos dessa natureza porque é só assim que a comunidade acadêmica vai entender quais são as contribuições efetivas do setor internacional. Se não fizermos esse esforço deliberado por parte da instituição de demonstrar como que o setor internacional é capaz de agregar e provocar mudanças institucionais, as pessoas vão continuar achando que o setor internacional só cuida de mobilidade de intercâmbio, e as nossas atribuições vão muito além disso. Então, eventos dessa natureza são fundamentais para dar visibilidade às atribuições do setor internacional.