Quando uma mega obra vira laboratório de aprendizagem

seg, 3 junho 2024 11:31

Quando uma mega obra vira laboratório de aprendizagem

Canteiro de obras do Complexo Cultural Yolanda e Edson Queiroz, um megaprojeto de 108.984m² de área a ser construída, se transforma em um grande laboratório de práticas acadêmicas para o curso de Engenharia Civil da Universidade de Fortaleza


Os alunos Miguel, José e Larissa, assim como os egressos Ronaldo e Rafaella, fazem parte da equipe de obras do Complexo Cultural (Foto: Ares Soares)
Os alunos Miguel, José e Larissa, assim como os egressos Ronaldo e Rafaella, fazem parte da equipe de obras do Complexo Cultural (Foto: Ares Soares)

Uma mega obra virou laboratório de aprendizagem. A construção do Complexo Cultural Yolanda e Edson Queiroz — com museu, teatro, torre educacional e praça que somam quase 109.000m² de área a ser construída — tem sido espaço fértil para alunos do curso de Engenharia Civil da Universidade de Fortaleza, instituição vinculada à Fundação Edson Queiroz (FEQ).

Das visitas técnicas aos estágios diretos com as empresas envolvidas, eles encontram neste projeto (que promete ser um “presente” para a capital cearense) um lugar para vivenciar a prática e aplicar a teoria do que veem na sala de aula. A experiência, comentam, garante excelência no aprendizado, contato com as tecnologias de vanguarda utilizadas na obra e peso no currículo.

“Atualmente, cerca de 70 alunos foram diretamente envolvidos nessas atividades, desempenhando papéis que variam desde observadores em visitas técnicas até participantes ativos como estagiários”, informa a coordenadora do curso de Engenharia Civil, Débora Barboza.

Ela conta que a ideia de a Unifor participar da construção do Complexo Cultural surgiu como uma forma de aliar a excelência acadêmica com a prática profissional em um projeto de grande impacto socioeconômico e cultural. “A FEQ, responsável pelo projeto, e a Unifor, como uma instituição de ensino de referência, enxergaram uma oportunidade única para proporcionar aos alunos uma experiência de aprendizado inestimável”, destaca.

As atividades acadêmicas foram, então, integradas às fases de construção da obra. A partir daí, alunos da graduação passaram a participar de visitas técnicas, reuniões com a equipe projetista e workshops que exploram as tecnologias utilizadas.

“Essas atividades são cuidadosamente planejadas para complementar o currículo acadêmico, permitindo que os estudantes vejam na prática os conceitos aprendidos em sala de aula”, aponta Débora. Os discentes abraçaram a ideia com entusiasmo.

Uma imersão na profissão ainda na graduação

Quando soube da possibilidade de atuar na mega obra do Complexo Cultural, Larissa Feijó de Pontes Leite entendeu que aquela era uma chance de mergulhar na profissão e vivenciar a prática pertinho da sala de aula.

No 5º semestre de Engenharia Civil, ela ouviu animada sobre essa oportunidade nas palestras realizadas pelo próprio curso e na divulgação feita pela coordenação. Decidiu, então, enviar seu currículo para a coordenadora Débora e conseguiu uma vaga de estágio na Sian Engenharia, empresa responsável pela obra. 

Como estagiária, Larissa tem atuado no auxílio de demandas do planejamento, com as planilhas de Excel e outros softwares. Também tem se debruçado na parte da gestão de qualidade da obra enquanto compartilha os acontecimentos do campo diariamente.


“Participar do projeto está sendo uma experiência incrível e única, [algo] que eu nunca imaginava porque ainda estou no 5º semestre. Estou tendo muita experiência aqui e sendo muito bem treinada por profissionais muito competentes. Além disso, estamos pegando a obra do início e vendo de tudo”Larissa Feijó, aluna de Engenharia Civil

Larissa conta que a experiência de poder ver na prática o que está aprendendo em sala de aula tem sido “maravilhosa”, especialmente pelo acesso às tecnologias de ponta envolvidas na construção.

A obra do Complexo Cultural utiliza um sistema de construção inovador chamado BubbleDeck. Ele é capaz de diminuir, consideravelmente, os impactos ao meio ambiente ao utilizar menos equipamentos e matérias-primas, como madeira, aço e concreto. “Está sendo muito importante trabalhar em uma obra de tanta visibilidade e magnitude. Vai me fazer crescer em vários aspectos: acadêmico, profissional e pessoal. É uma experiência incrível”, afirma.

Para ela, proporcionar uma oportunidade como essa para os estudantes é mais um diferencial da Unifor. “É um grande laboratório que você tem do lado da sua sala de aula. É uma chance maravilhosa de você aumentar seu aprendizado. O aluno vive uma imersão aqui dentro”, celebra.

Aprender em campo sem sair do campus

Miguel de Paula também conseguiu um estágio na obra do Complexo Cultural. Ia constantemente em busca de informações na coordenação porque sabia que esta seria uma grande oportunidade. Ele conta que a experiência tem sido enriquecedora, do planejamento à gestão de qualidade. O estagiário não fica preso a um setor específico, podendo acompanhar diversas frentes no canteiro de obras.

“Por se tratar de um projeto tão grande como esse, eu consegui aprender várias coisas que ainda nem estava vendo na graduação quando eu entrei. Isso me ajudou durante o meu processo acadêmico em algumas cadeiras”, narra.

Aluno do curso de Engenharia Civil, Miguel destaca que esta é uma oportunidade de aprender na prática, diretamente do campo, sem sair do campus da Unifor. “Estou aprendendo com funcionários muito competentes”, considera.

Ele diz esperar que o aprendizado por meio desta experiência também contribua no futuro, como profissional. “Espero que o que estou aprendendo aqui possa também me auxiliar com outros problemas que possam surgir durante um projeto que eu esteja gerindo no futuro”, completa. Seja como for, para ele, ter no currículo que participou da construção de uma obra da magnitude do Complexo Cultural será importante mesmo como estagiário.


“Para nós, da [graduação em] Engenharia Civil, é muito interessante participar de um projeto como este, porque tudo que aprendemos nos laboratórios, nas aulas, conseguimos trazer diretamente para o campo. E tudo dentro de ‘casa’, o que se torna algo muito gratificante”Miguel de Paula, aluno de Engenharia Civil

É sobre absorver futuros profissionais e disseminar sistemas inovadores

O engenheiro civil Paulo Roberto Ferreira de Castro é líder de contrato na Sian Engenharia, responsável pela megaobra. Ele diz que contar com a presença de alunos de graduação da Unifor em um projeto como este é uma oportunidade para complementar o ensino na prática e disseminar sistemas construtivos inovadores. A construtora também ganha em aproveitar e absorver futuros profissionais da área.

Paulo conta que a empresa venceu o processo de concorrência para execução do Complexo e formalizou a contratação em abril de 2023. É a responsável pela construção e acabamentos do Museu e das Áreas Comuns, enquanto a Torre Educacional e o Teatro deverão ser entregues apenas com a estrutura e o revestimento das fachadas em vidro.

A companhia então mobilizou profissionais técnicos para apoio à equipe de projetos executivos complementares, avaliou metodologias e processos construtivos, planejou etapas de execução da obra e avaliou prestadores de serviços, fornecedores e materiais etc.

Num segundo momento, montou o canteiro de obras, locações, gabaritos e instalações provisórias, enquanto os processos de legalização documental da obra, como licenças ambientais e alvará de construção, estavam em aprovação pelos órgãos competentes. Vencidas todas as etapas, mãos à obra!

“Por estarmos dentro de um grande centro de formação nas mais várias disciplinas relacionadas à construção civil e com a obra estando dentro das dependências da Universidade, estabeleceu-se o interesse mútuo para que absorvêssemos alunos da Unifor [ao quadro de colaboradores]”, conta Paulo.

A expectativa é de que, enquanto a obra avança, oportunidades sejam estendidas para alunos interessados nas áreas de engenharia ambiental, segurança e medicina do trabalho, gestão da qualidade, geotecnia, topografia, tecnologia de materiais, sistemas construtivos, dentre outras.

“Independentemente de estarem ou não integrados à equipe, há também a oportunidade concedida aos alunos e professores para visitação programada às dependências do canteiro de obras, seja para conhecimento de processos de gestão, conhecimento prático de execução serviços específicos, conhecimento das tecnologias empregadas, elaboração de estudos de casos ou para conhecimento geral de processos de controle de custos e planejamento de obras”, pontua o engenheiro da Sian.

Ele vê muitos benefícios em promover ações como esta de incluir alunos da graduação em uma megaobra durante as diversas fases construtivas. Um deles é estar antenado às normas brasileiras, que são constantemente revisadas no que diz respeito às questões ambientais, acessibilidade, segurança e exigências operacionais.

Outro benefício, aponta Paulo, é poder tratar de temas que não costumam ter disciplinas específicas nas universidades, como por exemplo patologias nas edificações e seus respectivos processos de recuperação, reforço, restauro ou de manutenção.


“A aproximação dos alunos ao canteiro de obras permite o entendimento e a compreensão das diferenças entre a teoria à prática. Em salas de aulas, normalmente, o ensino é direcionado para as condições ideais de trabalho, porém, na prática, as situações são as mais adversas possíveis. (...) A equipe da obra deve estar habilitada para prover soluções técnicas para o imponderável”Paulo Roberto de Castro, engenheiro civil e líder de contrato na Sian Engenharia

Um presente para Fortaleza

O Complexo Cultural é um “presente” para Fortaleza, com museu, teatro, cinema, auditórios e uma torre educacional de 19 pavimentos. As edificações, explica Paulo, serão interligadas por uma grande praça de contemplação, onde poderão ser realizados eventos de formaturas, shows e espetáculos em geral.

“O projeto é icônico, moderno e maravilhoso! Uma obra composta por estas três edificações totalmente revestidas com vidros de alta performance, com uma arquitetura ímpar e com desafios técnicos a serem vencidos com o uso de tecnologias e vários sistemas construtivos inovadores. É, sem dúvida, uma contribuição para a engenharia civil e para os profissionais que dela poderão participar”, aponta.

Além dos alunos que se tornaram estagiários na obra, egressos da instituição também participam do projeto por meio da Sian Engenharia. Eles dizem estar realizados em voltar à casa onde foram formados como profissionais em uma megaobra que certamente marcará a capital cearense.

Voltar à casa em um posto de liderança

“Voltar à Unifor depois de tantos anos é muito gratificante. Fui aluno da instituição e agora volto para executar uma grande obra da Fundação que mantém a Universidade. Não é só voltar, é voltar em um cargo de tomada de decisões”, celebra o engenheiro civil Ronaldo Sena.

Graduado há quase 17 anos, ele é gerente de produção na obra do Complexo Cultural Yolanda e Edson Queiroz por meio da Sian Engenharia, empresa onde atua desde 2019. É de Ronaldo a responsabilidade de coordenar e gerir colaboradores próprios, fornecedores e equipamentos.

“Tenho que estar muito afinado com a área de planejamento, porque nós planejamos a obra em conjunto, mas depois que é processado o planejamento, eu tenho que executar aquilo que é planejado”, conta. Ele também faz a ponte com a FEQ, que tem engenheiros, arquitetos e técnicos próprios, que costumam dialogar sobre projetos, sugestões, suprimentos e aquisições. 

Ronaldo Sena conta que sempre gostou do ambiente acadêmico. Tanto que foi laureado ao obter a maior performance média global quando se formou, em 2007.2. “Então, me sinto extremamente feliz e honrado de fazer parte desse empreendimento”, afirma.

Com um curso de Estradas pela antiga escola técnica, ele já atuava em obras quando ingressou no curso de Engenharia Civil da Unifor. Essa experiência, conta, o ajudou muito na sua jornada universitária e profissional. Ao contratar alunos de Engenharia Civil da Unifor, ele acredita que a obra do Complexo Cultural dá uma oportunidade semelhante. “Eles [alunos] têm uma vivência prática que eu considero extremamente importante”, pontua.


“Os estagiários que fazem parte da obra vão ser diferenciados por conta do conhecimento que vêm adquirindo com a experiência. Quando se lançarem no mercado de trabalho, por ter participado de uma obra de tal magnitude, vão ter facilitada a vida profissional. (...) Realmente é uma sinergia total entre o que está sendo visto, estudado e a vida real”Ronaldo Sena, egresso do curso de Engenharia Civil da Unifor e gerente de produção na obra do Complexo Cultural Yolanda e Edson Queiroz

Ronaldo destaca que, além dos estagiários, há alunos pesquisadores que fazem atividades no canteiro de obras junto ao corpo docente. Ele diz que, além da Engenharia Civil, há atividades de cursos que atuam nas áreas de arquitetura, biologia e química.

Um aprendizado constante

Rafaella Melo se formou em Engenharia Civil em 2023.2. Estagiária da Divisão de Projetos e Obras (hoje dividida em dois departamentos: de Manutenção e de Projetos e Obras) da Unifor, ela foi convidada para a seleção do projeto do Complexo Cultural como analista de planejamento.

Hoje, atua fazendo relatórios, controle de qualidade e fiscalização na obra pela Fundação Edson Queiroz. Também trabalha com cronograma, planejamento de obra, controle de custo e elaboração de orçamentos.

A egressa conta que, desde que começou como estagiária na Unifor, percebeu o desejo de inovação e pesquisa da Universidade e se debruçou também nesta busca constante por melhorias. Quando lhe perguntaram se gostaria de participar deste projeto ou permanecer no setor onde atuou por dois anos de estágio, optou por tentar a experiência na megaobra. Fez entrevista e conseguiu a vaga.


“Fui muito incentivada a sempre buscar mais no estágio e na Universidade, tanto na sala de aula como profissionalmente. Tanto que agora estou fazendo uma pós-graduação na Unifor em Estrutura de Concreto Armado nas Edificações. Acho que vai agregar bastante os dois caminhando juntos”Rafaella Melo, egressa de Engenharia Civil e analista de planejamento na obra do Complexo Cultural Yolanda e Edson Queiroz

Para ela, participar de uma obra deste porte, com uma edificação de 19 andares, é especial. E conta que tem aprendido muito com arquitetos e calculistas, com quem mantém conversas frequentes, e com a oportunidade de trabalhar com a tecnologia BubbleDeck, um meio de cortar custos e reduzir impactos ambientais. 

Acredito que isso agrega muito também na minha carreira profissional. Por mais que eu seja competente no cargo, eu acredito que sempre aprendemos mais, descobrindo novas formas de inovação”, diz.

Muitas formas de se envolver com o megaprojeto

A coordenadora Débora Barboza conta que, desde o início do projeto, os cursos de Engenharia da Unifor, especialmente o de Engenharia Civil, estão atrelados à construção do Complexo Cultural por meio de uma série de estratégias de integração.

“A colaboração estreita com a equipe de construção e projetistas permitiu que os conceitos teóricos discutidos em sala de aula fossem diretamente aplicados e observados no canteiro de obras. Esta abordagem prática visa enriquecer a formação dos alunos, preparando-os para os desafios do mercado de trabalho”, destaca.

Ela lembra que a Unifor proporciona diversas oportunidades aos alunos de participarem ativamente do projeto. Neste semestre, por exemplo, já foram realizadas visitas técnicas para disciplinas como Hidráulica e Geologia, além de uma visita técnica especial para a Semana de Engenharia Civil. “Estas visitas permitem aos alunos observar e entender as diferentes etapas da construção, os desafios enfrentados e as soluções implementadas”, explica.

Também foram organizadas reuniões entre professores, alunos e a equipe projetista para discutir as tecnologias de ponta empregadas na obra. “As discussões são transformadas em material didático para as aulas, garantindo que os alunos tenham acesso a conhecimento atualizado e relevante”, pontua.

Segundo Débora, o curso de Engenharia Civil da Unifor tem promovido uma variedade de atividades relacionadas ao projeto, englobando tanto experiências acadêmicas quanto práticas. Vamos conhecer algumas?

  • Visitas Técnicas
    Realizadas para disciplinas como Hidráulica e Geologia, permitindo que os alunos observem e analisem diretamente os aspectos referentes à fase inicial de alocação da obra como os ensaios geotécnicos e escavação.
  • Reuniões Técnicas
    Envolvendo corpo docente, alunos e a equipe projetista para discussão das tecnologias empregadas na obra, como técnicas de construção avançadas e soluções sustentáveis.
  • Semana de Engenharia Civil
    Incluiu uma visita técnica específica ao canteiro de obras do complexo, proporcionando uma visão abrangente do progresso da construção e das técnicas utilizadas.
  • Workshops e Seminários
    Focados em temas como novas tecnologias na construção civil, sustentabilidade e gerenciamento de grandes projetos, com a participação de profissionais envolvidos no projeto.
  • Estágios em Empresas Envolvidas
    Alunos do curso de Engenharia Civil estão estagiando em empresas diretamente envolvidas na construção do complexo, como a BubbleDeck Brasil e a Sian Engenharia. Esses estágios permitem que os alunos adquiram experiência prática e contribuam diretamente para o projeto, realizando atividades que incluem análise de estruturas, planejamento de obras, e aplicação de tecnologias inovadoras.


“A combinação de atividades acadêmicas e práticas proporciona aos alunos uma formação completa, integrando teoria e prática de maneira eficaz, e oferecendo uma visão realista e detalhada do funcionamento de um grande projeto de engenharia”Débora Barboza, coordenadora do curso de Engenharia Civil

Débora ressalta que os ganhos de envolver os alunos em projetos desta magnitude são significativos tanto para os estudantes quanto para a Universidade. “Para os alunos, a experiência prática em um projeto real de grande escala proporciona uma compreensão aprofundada dos processos de engenharia, fortalece habilidades técnicas e interpessoais, e aumenta a empregabilidade ao agregar um diferencial competitivo ao currículo”, argumenta.

Já para a Universidade, ela acredita que essa colaboração reforça seu compromisso com a excelência acadêmica e inovação, melhora a qualidade do ensino através da integração de tecnologias de ponta e fortalece a reputação institucional ao estar associada a um projeto de grande relevância cultural e socioeconômica.