Setembro Amarelo: Entenda a importância das redes de apoio para a saúde mental

Processo de recuperação e manutenção do bem-estar psíquico é favorecido quando profissionais reconhecem e orientam as redes de apoio

Se lidar com problemas relacionados à saúde mental já é uma tarefa difícil para quem pode contar com a ajuda de parentes e amigos, para quem não tem esse suporte, a situação se torna ainda mais complexa.

Manter a disciplina necessária para realizar um tratamento — que muitas vezes envolve medicação, terapia, exercícios físicos, entre outras atividades —, sem incentivo e ajuda externa pode ser algo extremamente pesado e emocionalmente custoso. Nesse contexto, é notável a importância das redes de apoio. 

Suporte emocional e institucional

Docente do curso de Psicologia da Universidade de Fortaleza, da Fundação Edson Queiroz, a professora Leônia Teixeira explica que a noção de rede de apoio implica uma ampliação da experiência do cuidado. Essa atenção especial pode ser alcançada tanto por meio de ações do Estado, quanto por pessoas que mantêm relações familiares, de afeto, de vizinhança e de referência.

“Uma rede de apoio pode ser composta por profissionais de equipamentos de saúde, de educação, da assistência social, mas, muitas vezes, são pessoas dos vínculos mais próximos que possuem relações de identificação com quem sofre”, ressalta a psicóloga. Ela afirma que, quando os profissionais responsáveis pelo tratamento reconhecem e orientam a rede de apoio, é possível perceber diferenças positivas no processo de recuperação.

Em contrapartida, quando o tratamento se concentra somente na prescrição medicamentosa, não havendo reconhecimento do papel da rede de apoio, isso pode ter efeitos negativos na intervenção. “Considerar que laços afetivos possibilitam o compartilhar de experiências e de saberes é fundamental”, assegura a professora.

Para Janara Pinheiro Lopes, também docente da graduação em Psicologia da Unifor, as políticas públicas têm papel fundamental como redes de apoio. Ela observa que quanto mais pessoas desempregadas, sem escola, sem perspectiva ou projetos de vida, mais adoecimentos vão existir.



“Quando penso na recuperação de pessoas com problemas relacionados à saúde mental, estou pensando em valores nas escolas, nos setores de educação e segurança pública. Não poder circular na cidade por medo de assaltos, [por exemplo], traz adoecimento”Janara Pinheiro Lopes, doutora em Psicologia e docente da Unifor

 


Acolhimento é essencial

Entre os benefícios que a rede de apoio traz ao indivíduo, um deles é não reproduzir o preconceito que é visto fora desse círculo. “No consultório, vejo que as pessoas têm medo de dizer que um familiar tentou cometer suicídio. Mas não podemos julgar nem gerar preconceito. [...] Todos podemos passar por isso, uma vez que não conhecemos nossas fragilidades psicológicas”, alerta Janara.

A docente menciona também o valor das amizades em momentos de sofrimento psíquico. Além do apoio que podem oferecer, é essencial que os amigos também estimulem o autocuidado. “É importante incentivar a busca por um psicólogo, um psiquiatra. Dizer que aquilo pelo que a pessoa está passando não é frescura, trata-se de algo sério”, destaca.



Além dos profissionais de saúde, familiares e amigos podem ser uma fonte vital de conforto e ajuda para cuidarmos da mente (Foto: Getty Images)


Conforme explica Janara, a companhia de pessoas com quem o paciente possui laços de afeto pode levar a experiências que estimulem a produção de dopamina, serotonina e endorfina de maneira natural.

A psicóloga indica acompanhar a pessoa a uma viagem, a um passeio à praça do bairro, a atividades físicas ou a uma aula de artes, por exemplo. “São momentos que têm a ver com a plasticidade neuronal de fazer novas conexões para produzir hormônios do prazer. E isso está ligado às experiências de vida”, frisa.

Atenção aos pontos fracos

Por estarem mais próximas ao paciente, as pessoas que compõem a rede de apoio podem ter mais atenção aos pontos fracos já conhecidos. “Imagina se a pessoa tem dificuldade com álcool e a família vai fazer um churrasco com muito acesso a cerveja no local? Esses cuidados os familiares podem ter”, exemplifica a psicóloga.

Ela cita também a questão do desemprego, que pode trazer sofrimento psíquico, e do distanciamento, que acontece sem que seja percebido. “Vale a pena diminuir o tempo de celular para estar realmente com o outro. A tecnologia aproxima, mas pode também ser excessiva e distanciar as pessoas, que passam a se sentir muito sozinhas”, sinaliza Janara.

Suporte à rede de apoio

Em muitos casos, quem ocupa lugares de cuidado continuado também precisa de amparo. Ter a oportunidade de compartilhar vivências, ser acompanhado psicologicamente, poder ser ouvido sobre seus próprios sentimentos em relação à situação do paciente e expressar emoções provenientes dessas experiências pode fazer a diferença para a saúde mental de uma rede de apoio.



Pessoas que participam de redes de apoio também precisam de atenção em relação à própria saúde mental (Foto: Getty Images)


Há associações de pacientes e familiares que ocupam essa importante função de dar suporte emocional às redes de apoio. Como exemplo, destacam-se grupos nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e nas Unidades Básicas de Saúde, como postos de saúde.

“Quem faz parte da rede de apoio precisa de cuidados. Em uma perspectiva ampliada, estou lembrando do professor, do policial, do profissional da saúde, do trabalhador. Para cuidar da própria saúde mental, é necessário descanso e lazer, além de alternativas como psicoterapia e artes”, conclui Janara.