qua, 11 novembro 2020 10:26
Arte Contemporânea é difícil de entender? Respostas para conhecer melhor essa vertente
A curadora de arte Denise Mattar comenta as expressões artísticas com técnicas inovadoras
Falar sobre arte é também falar sobre História. Ao encontro dessa ideia nasce a Arte Contemporânea: após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), o contexto de globalização e avanços tecnológicos permitiu que os artistas utilizassem experiências inovadoras em suas criações.
Os processos artísticos foram então atravessados pelo conceito e pela atitude. Ao mesmo tempo em que se produzia arte, também era possível refletir sobre ela. Assim, a Arte Contemporânea rompeu paradigmas e abriu caminhos para diferentes técnicas e linguagens artísticas como a dança, a música, a pintura, o teatro e as performances.
Confira a seguir algumas perguntas fundamentais sobre Arte Contemporânea respondidas por Denise Mattar, curadora exposição “Da Terra Brasilis à Aldeia Global - 2ª edição”, em cartaz no Espaço Cultural da Universidade de Fortaleza:
O que caracteriza a Arte Contemporânea como expressão?
Denise Mattar - A pluralidade de expressões e a contaminação entre os suportes. Se há alguns anos tínhamos categorias: pintura, desenho, gravura, escultura, hoje podemos ter tudo isso numa obra só. Essa interação entre mídias é libertadora e abre espaço para novas possibilidades artísticas. A Arte Contemporânea espelha a contemporaneidade. O mundo está absolutamente caótico sem saber lidar com a revolução digital, com as mídias sociais, as fake news, as radicalizações de todos os tipos e uma pandemia inimaginável…Mas lembremos que, ao mesmo tempo, temos uma democratização do conhecimento que nunca aconteceu antes na história da humanidade...Tempos interessantes e desafiadores. A arte de hoje expressa essa multiplicidade e essa confusão que nos rodeia.
Como a Arte Contemporânea se relaciona com outras vanguardas, no sentido da “provocação estética”, por exemplo?
Denise Mattar - A expressão vanguarda significa estar à frente, e quem está à frente enxerga antes dos que vêm atrás. Essa visão é, na maior parte das vezes rejeitada, para depois ser aceita. O ser humano não gosta de mudar suas “verdades”...Isso ocorre em todos os campos: na ciência, na música e na artes. São inúmeros os exemplos que podemos dar: Galileu quase foi queimado, Darwin rejeitado, a Bossa Nova foi ridicularizada, assim como o foram Caravaggio, o Impressionismo, Van Gogh, etc. A vanguarda propõe novas formas de lidar com o mundo, e as aparentes provocações de hoje, podem ser as verdades de amanhã.
Por que existe esse discurso de que a Arte Contemporânea é difícil de ser compreendida/interpretada?
Denise Mattar - O problema de fato existe com uma parcela da produção artística contemporânea, que é muito hermética e supõe que o espectador tenha um repertório muito complexo, o que não é verdadeiro para a maior parte do público. Tributo isso à circulação cada vez maior dos artistas nos fechados meios acadêmicos. Mas não é verdade para todos, há grandes artistas contemporâneos, conceituais mesmo, como Regina Silveira, Cildo Meireles, Adriana Varejão, que conseguem ter um trabalho contundente, mas que chega ao público. Na edição passada da Unifor Plástica tivemos excelentes artistas cearenses fazendo muito bem essa ponte com o público sem perder seu objetivo.
Em sociedades em que a arte está inserida no dia a dia das pessoas como uma programação de lazer e cultural, existe uma desmistificação dessa colocação?
Denise Mattar - Sem dúvida se você vai a exposições desde criança seu olhar se torna mais aberto, e se as instituições têm apoio tudo funciona mais e melhor. Hoje nas grandes cidades brasileiras há oferta de espaços culturais (apesar de geridos com dificuldades). Fortaleza, por exemplo, tem, entre outros, a Unifor, o Dragão do Mar, o Museu da Fotografia, o Museu da Indústria, o Mauc - mas o hábito de frequentar exposições não existe para a maioria da população. Isso exigiria um amplo trabalho educacional, e, naturalmente, recursos destinados a tornar os espaços e sua programação mais intensa e variada, assim como assegurar o acesso através da disponibilização de ônibus, e publicidade também. Outro fator que poderia ajudar muito seria a imprensa dar mais atenção e espaço à programação cultural.
Como a Arte Contemporânea propõe uma reflexão acerca da mensagem daquilo que foi criado pelo artista?
Denise Mattar - Acho que hoje os artistas estão sendo excessivamente cobrados para que sua obra tenha uma mensagem política, social ou identitária, mas a arte tem que ser livre. Há artistas cuja arte é engajada e que têm uma força extraordinária, há outros, entretanto, que se interessam pela natureza de ser humano, por problemas filosóficos e interiores, e outros ainda que se reportam à natureza, à passagem do tempo, e até à beleza, por que não?
Alguma dica para quem quer começar a conhecer arte contemporânea?
Denise Mattar - Isso pode ser feito de forma suave, bela, e agradável, mas também pela contundência. A arte contemporânea propõe uma experiência ao visitante, que muitas vezes é chamado a não ser apenas um espectador, mas um ator. Deixe a arte entrar em você sem preconceitos e pressupostos e vai se surpreender. Comece pelos artistas locais, e o Ceará tem muitos artistas contemporâneos interessantes. Tantos que nem me arrisco a citar nomes…antes sugiro que apreciem o catálogo virtual interativo da última Unifor Plástica no link. Lá encontrarão textos, imagens, fotos, biografias, vídeos e áudios. Boa imersão!
Para visitar
A exposição “Realtopia”, do artista cearense Stênio Burgos, está em cartaz no Espaço Cultural Unifor até 20 de dezembro de 2020. Com foco exclusivo no trabalho do artista, a mostra conta com 82 obras, que revelam a desobediência impulsiva e criativa que resulta na expressão de uma sensualidade colorida e vibrante.
Além da mostra de Stênio Burgos, nas galerias térreas, segue em cartaz, nas galerias superiores do Espaço Cultural Unifor, a exposição “Da Terra Brasilis à Aldeia Global”, com obras da Coleção Fundação Edson Queiroz que reunem grandes artistas nacionais e internacionais, em uma abordagem histórica e didática.
As visitações gratuitas acontecem de de terça a sexta-feira, das 9h às 17h; sábados e domingos, das 10h às 17h. Agendamento para visitas pelo telefone (85) 3477.3319.