seg, 19 fevereiro 2024 10:28
Entrevista Nota 10: Marcio Ballas e o poder do improviso na construção da criatividade
Apresentador e improvisador fala sobre a carreira de palhaço e o papel do improviso no desenvolvimento da criatividade e inovação, habilidades cada vez mais desejadas no mercado de trabalho
Ser criativo exige ter, em partes, a capacidade de saber lidar com o imprevisível, utilizando o que não foi planejado em algo novo e interessante. E são nesses momentos que a capacidade do improviso se faz extremamente bem-vinda. Uma habilidade essencial para quem busca se destacar não só na vida ou na arte, mas também no mercado de trabalho.
“Criatividade, escuta e improviso são skills que cada vez mais as empresas estão precisando, buscando e fazendo com que seja um elemento necessário para a pessoa se desenvolver profissionalmente”, afirma o improvisador Marcio Ballas, que há 20 anos ministra palestras e cursos no ramo corporativo sobre improviso e criatividade.
Pioneiro e maior referência de improviso no Brasil, o palhaço, apresentador e diretor artístico estará na Universidade de Fortaleza no dia 21 de fevereiro. Na ocasião, ele vai apresentar a palestra “Desbravando fronteiras: a criatividade a partir do improviso” na acolhida dos estudantes do Centro de Ciências da Comunicação e Gestão (CCG) da Unifor para o semestre 2024.1.
Os participantes terão a oportunidade de mergulhar nas experiências do palestrante, aprender com seus métodos e compreender como o improviso pode ser aplicado para o desenvolvimento de soluções criativas. Será uma jornada inspiradora, proporcionando insights valiosos a quem busca ampliar os horizontes e explorar novas possibilidades.
Marcio Ballas viveu em Paris, onde estudou na École Internationale de Théâtre Jacques Lecoq. Apresentou-se com os “Palhaços Sem Fronteiras” franceses na África e em campos de refugiados durante a guerra do Kosovo. Foi campeão mundial de improviso no Festival Internacional de Bogotá.
No Brasil, foi palhaço dos “Doutores da Alegria” em hospitais e apresentador do “É Tudo Improviso”, na Band, “Cante se Puder" e “Esse Artista Sou Eu”, ambos no SBT. Além disso, é diretor artístico da Casa do Humor e esteve em cartaz com a “Noite de Improviso”, no Comedians Club, durante nove anos.
O apresentador também é formado em Marketing pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) e pós-graduado em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Além de ser mestre de cerimônia, ele produz o “BallasCast”, podcast com mais de 500 mil downloads.
Na Entrevista Nota 10 desta semana, Ballas fala sobre a carreira de palhaço e o papel do improviso no desenvolvimento da criatividade e inovação, habilidades cada vez mais desejadas no mercado de trabalho.
Confira na íntegra a seguir.
Entrevista Nota 10 — Hoje você é considerado a maior referência de improviso no Brasil. Antes disso, por dez anos, você gerenciou uma papelaria, negócio que foi do seu pai. Como foi sua trajetória dali até se tornar o “rei do improviso”? A habilidade de improvisar é inata ou foi desenvolvida?
Marcio Ballas — Quando eu tinha 17 anos, meu pai faleceu, então comecei a trabalhar na papelaria que ele tinha ali no Largo do Arouche, no centro de São Paulo, e lá fiquei por dez anos. Eu não fazia nada artístico até que, em 1994, fiz um curso de palhaço, por curiosidade mesmo. E esse curso me virou a cabeça. Fiquei muito encantado, achei muito incrível. Aí comecei, junto com o meu trabalho, paralelamente investigar tudo que tinha de palhaço, os poucos cursos de palhaço que tinham à época.
Três anos depois isso ficou muito forte, essa vontade foi maior do que eu. Larguei a papelaria, deixei tudo aqui no Brasil e fui estudar pra ser palhaço. Na época, minha mãe ficou desesperada, ela não concordou muito, mas eu queria tentar ir atrás desse sonho e eu tinha que buscar me profissionalizar, estudar mesmo pra valer. Acabei indo pra Nova York, onde fiquei quatro meses estudando, e depois para Paris, onde eu fiquei três anos. Fiz uma escola de teatro, fiz cursos de palhaço e assim, depois disso, eu voltei ao Brasil e comecei minha carreira de ator e palhaço profissional.
Entrevista Nota 10 — Você é professor dos cursos de Improviso e Palhaço na Casa do Humor, escola que criou há 11 anos e onde atua também como diretor artístico. O que tem em comum entre o palhaço e o improviso? Como essas competências podem se ligar ao empreendedorismo?
Marcio Ballas — Logo que voltei ao Brasil, eu tinha que trabalhar como palhaço e como ator, e uma das maneiras de compartilhar o conhecimento todo que eu tinha aprendido foi através das aulas e dos cursos. Daí surgiu a Casa do Humor, que é uma escola que eu ensino para pessoas de qualquer formação, de qualquer área. Não tem nenhuma necessidade de ter nenhuma experiência artística nas linguagens do palhaço e do improviso.
Então, vem pessoas que são advogados, médicos, professores, pessoal de T.I., recursos humanos, todas as áreas, porque é um curso de iniciação, onde eu ensino esses princípios do palhaço e do improviso para as pessoas poderem levar pros seus trabalhos, pras suas vidas, pras suas relações.
Isso tem muito a ver com o empreendedorismo no sentido de que muitas das habilidades que trabalhamos no palhaço e na improvisação são fundamentais e cada vez mais necessárias nos dias de hoje. Vou dar exemplo de algumas: criatividade, escuta e improviso são skills que, cada vez mais, as empresas estão precisando, buscando e fazendo com que seja um elemento necessário para a pessoa se desenvolver profissionalmente.
Entrevista Nota 10 — Além de ator, palhaço, improvisador, apresentador e diretor, você ainda é palestrante de criatividade. Nos eventos e workshops que já conduziu, que mensagem você busca transmitir? De que forma você vê a ligação da criatividade com o ambiente corporativo e o mercado de trabalho mais “tradicional”?
Marcio Ballas — Inicialmente, eu comecei a fazer espetáculos de improviso dentro das empresas. Elas me chamavam, eu ia com o meu grupo e nós fazíamos um espetáculo de improviso, que é criado ali na hora aos olhos da plateia, totalmente improvisado. O que começou a acontecer é que os diretores e gerentes, sempre que chamavam a gente, quando acabava [a apresentação], eles perguntavam “Mas Ballas, como é que vocês fazem isso? Como é que vocês são tão criativos?”.
E a partir dessa curiosidade, dessa demanda que comecei a receber, eu acabei fazendo algumas palestras. Uma delas é essa que eu vou apresentar na Unifor que chama-se “Improviso e Criatividade”, onde eu falo como as pessoas podem ser mais criativas e mais inovadoras através dos princípios que trabalhamos na improvisação teatral.
Entrevista Nota 10 — No dia 21 de fevereiro, você vem à Unifor ministrar a palestra “Desbravando fronteiras: a criatividade a partir do improviso” para os alunos dos cursos do Centro de Ciências da Comunicação e Gestão. Na sua visão, como o improviso pode ser aplicado para o desenvolvimento de soluções criativas tanto na rotina acadêmica dos estudantes quanto em suas carreiras profissionais?
Marcio Ballas — Depois de muitos anos dando aulas e fazendo palestras nas empresas, eu entendi que tem um elemento que trabalhamos no improviso que é a essência do nosso trabalho. Esse elemento é o “sim”. O “SIM” maiúsculo! O “sim” é uma maneira de vermos o mundo. Quando estamos fazendo uma cena de improvisação, um ator sempre tem que dizer “sim” pro outro, pra cena ser criada e construída conjuntamente. E isso vale para qualquer tipo de processo criativo. Esse “sim” é o elemento central que trabalhamos no improviso e no palhaço e ele pode ser levado para qualquer tipo de criação, em qualquer ambiente e em qualquer lugar.
Entrevista Nota 10 — Em tempos de modernidade líquida e de virtualização das relações – seja no âmbito dos relacionamentos interpessoais, seja no meio profissional – o que o palhaço pode nos ensinar para não perdermos a sensibilidade e lembrarmos que ainda estamos lidando com seres humanos?
Marcio Ballas — O palhaço nada mais é do que o espelho do homem. O palhaço reflete o que somos mesmo de verdade. No fundo, todos nós queremos ser incríveis, invencíveis, perfeitos, mas a verdade é que, junto com a nossa genialidade, com a nossa inteligência, o ser humano também é falível, também é ridículo. E o palhaço vem ensinar isso pra gente.
Então, no trabalho do palhaço, ensinamos a ser mais vulnerável, a fazer uma escuta mais completa do outro, a perceber a plateia e estar em contato, em conexão com o outro. Acho que o palhaço, cada vez mais, vem ensinar para nós como é que podemos ser mais criativos e mais plenos nas nossas vidas.
Entrevista Nota 10 — Por fim, o que de mais valioso a palhaçaria trouxe para Marcio Ballas?
Marcio Ballas — Depois de muitos anos dando cursos, palestras nas empresas e ouvindo feedback de alunos, eu entendi que tanto o improviso quanto o palhaço são maneiras de vermos a vida. Mais do que apenas uma linguagem, uma técnica ou um ofício, é uma maneira de estarmos no mundo. É uma maneira da gente ser. Então, quanto mais eu conseguir trazer o palhaço para minha vida, mais eu vou ser feliz. Isso é o que eu aprendi.