O fenômeno mercadológico “Barbie”

seg, 17 julho 2023 14:34

O fenômeno mercadológico “Barbie”

Como a boneca mais popular do mundo expandiu seu universo cor-de-rosa para além das brincadeiras de criança?


O filme live action “Barbie”, que será lançado dia 21 de julho de 2023, traz a atriz Margot Robbie para interpretar a icônica boneca (Foto: Divulgação/Warner Bros)
O filme live action “Barbie”, que será lançado dia 21 de julho de 2023, traz a atriz Margot Robbie para interpretar a icônica boneca (Foto: Divulgação/Warner Bros)

De repente, tudo virou rosa. Ao abrir as redes sociais, anúncios de produtos e serviços aparecem banhados com a cor favorita do momento. O motivo da comoção ao redor de algo considerado banal não surpreende: a boneca Barbie, ícone cultural e fenômeno global, conseguiu ficar ainda mais famosa depois do anúncio do seu primeiro filme homônimo live action com lançamento para julho deste ano.

Criada em 1959 pela empresária norte-americana Ruth Handler, a boneca nasceu com a premissa de ser diferente dos brinquedos voltados para meninas daquela época, que tinham o objetivo de estimular o papel de cuidadora nas pequenas. Ao surgir com um design considerado “mais adulto”, roupas estilosas e maquiagem, a Barbie conquistou o coração de milhões de crianças e adultos pelo mundo.

Mas seu alcance não ficou limitado ao universo dos brinquedos e, com o passar das décadas, a marca alcançou um patamar invejável de reconhecimento que só nomes como Disney e Coca-Cola sustentam. Reconhecida, entre muitas coisas, por um tom específico de rosa, a menina dos olhos da Mattel — empresa de brinquedos responsável por sua criação — se tornou mais do que apenas uma boneca.


A boneca Barbie foi lançada em 1959 como uma proposta disruptiva de brinquedos para garotas na época (Foto: Mattel/Divulgação)

Símbolo da cultura pop, inspiração para cantoras como Nicki Minaj — cujos fãs são conhecidos como “Barbz” — e personagens como Elle Woods, do filme “Legalmente Loira”, e Sharpay Evans, de “High School Musical”, a Barbie se tornou insubstituível.

Sua aparência moderna e inovadora, que permanece mesmo depois de 64 anos após seu lançamento, tornaram a boneca um símbolo de estilo, força impulsionadora da moda e ferramenta eficaz de marketing

Crise de identidade?

A figura esbelta, de cabelos loiros e guarda-roupa invejável, entretanto, custou a acompanhar as mudanças da sociedade. De acordo com a revista Time, em 2014, a Barbie teve um ano ruim. Além das críticas ao visual da boneca, que favorecia padrões de beleza enraizados na sociedade, muitas mães temiam o efeito que o brinquedo teria na autoestima de suas filhas, que tinham a boneca como modelo a ser seguido. 

Nesse mesmo período, com o lançamento do filme “Frozen”, da Disney, as vendas da boneca da Rainha Elsa, protagonista do desenho, superaram as da Barbie. Para piorar a situação, a Lego ultrapassou a Mattel como a maior empresa de brinquedos. As coisas não estavam nada fáceis no mundo cor-de-rosa. A boneca mais popular da história passava, pela primeira vez, por uma verdadeira crise de identidade. 

As críticas fizeram com que a Mattel ponderasse como seu produto se encaixaria na sociedade atual, levando em consideração as mudanças sociais. Depois de muita análise e reuniões com o time de design e demais setores da empresa, a boneca deu um grande passo rumo à diversidade e inclusão: foram acrescentados novos tons de pele, estilos de cabelo e tipos de corpos, totalizando hoje 175 Barbies diferentes.


A Mattel passou a fabricar e vender Barbies com diferentes tipos de corpos para se adequar às demandas de inclusão (Foto: Mattel/Divulgação)

“Por muitas gerações, a Barbie foi o principal brinquedo das crianças. Ao enfrentar críticas pesadas, mas válidas, a Mattel precisou investir muito em marketing para se recuperar, fortalecendo a cor pink atrelada à boneca e usando todos os tipos de mídia para se reinventar e continuar encantando novas gerações a cada ano”, pontua Renata Regueira Gama, docente do curso de Marketing da Universidade de Fortaleza, da Fundação Edson Queiroz.

Ícone fashion

Revolucionária, inovadora e trendsetter. Essa é a Barbie desde o momento em que foi criada. Seu guarda-roupa diversificado abrange desde trajes de banho a vestes mais formais e sofisticadas, permitindo que seu consumidor explore diferentes estilos e crie seu próprio senso de moda. A boneca exala criatividade e expressão pessoal e carrega um legado intrínseco ao mundo da moda, inspirando estilistas e designers há décadas.

Marília Cidrão, egressa da graduação em Design de Moda da Unifor, trouxe a Barbie ao ambiente acadêmico. Influenciada de forma positiva pela marca, a profissional decidiu homenageá-la em diversas produções durante seu período na Unifor, finalizando a jornada ao colocar a boneca como protagonista de seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC).

Intitulado “Barbie: para além da futilidade e da brincadeira”, a produção trouxe um novo olhar para o mundo rosa. “A Barbie foi minha boneca preferida durante a infância, brinquei com ela até meus 13 anos. Sempre a achei um pouco injustiçada pelo estereótipo de fútil, então eu queria realmente contar a história dela e quebrar essa visão”, relata a designer de moda. 


Marília Cidrão, egressa do curso de Design de Moda da Unifor, produziu um editorial inspirado na boneca (Foto: Arquivo pessoal) 

A estética da Barbie, antes vista com maus olhos por lentes preconceituosas, aponta hoje para um movimento de resgate a símbolos considerados femininos, deixando os estereótipos de futilidade e superficialidade para trás. Um grande exemplo é o estilo denominado Barbiecore, difundido fortemente pelas redes sociais no último ano.

O próprio nome já diz tudo: a tendência é inspirada na estrela da Mattel. Ao capturar o visual e espírito divertido e feminino associados à boneca, a tendência traduz a personalidade do indivíduo em roupas, acessórios e maquiagem – a maioria em tons de rosa, ainda que cores como roxo e turquesa também sejam muito utilizadas pelos adeptos. O Barbiecore também abraça uma atitude positiva e confiante, celebrando a feminilidade.

“A Barbie dita um lifestyle. Ela influencia mais a moda do que o contrário. Prova disso são as grandes marcas internacionais que até hoje fazem colaborações com ela. [Recentemente], vimos surgir o Barbiecore, grande movimento de moda, além da cor Pink Valentino, que foi amplamente usada em desfiles da marca de luxo Valentino”, acrescenta Marília.

O mundo é da Barbie

O potencial de marketing da Barbie é gigantesco, e a Mattel sabe aproveitá-lo como ninguém ao apostar em todas as possibilidades. A boneca — que já foi princesa, bailarina, fada, sereia e astro do rock — protagonizou filmes, séries, programas de televisão e campanhas publicitárias.

Com sua imagem aspiracional, além de suas centenas de profissões, que vão de médica veterinária à astronauta, a boneca se tornou figura emblemática na mídia. Ainda que o marketing e, especialmente, o branding da Barbie sejam fortes, o anúncio do primeiro live-action do icônico brinquedo agitou o mercado.

À medida que o lançamento do longa se aproxima, dezenas de marcas lançam edições limitadas de seus produtos em parceria com a Barbie, como GAP, C&A e Riachuelo. Em uma colaboração com o Airbnb, é possível ainda, durante o fim de semana do lançamento do filme, reservar uma diária na mansão da Barbie, em Malibu, na Califórnia.

Renata Regueira pontua que a Mattel e sua equipe de marketing criaram uma tática que une entretenimento e produtos. Segundo ela, o filme faz parte da estratégia de crescimento e reposicionamento da marca: não à toa, todas as colaborações serão lançadas junto com o longa.

“A lista parece não ter fim: maquiagens, roupas, escovas de dentes e até cruzeiros especiais. Quanto mais gente assistindo ao filme, mais pessoas ficarão impactadas pelos diversos produtos com a marca Barbie”, explica a docente.

Nostalgia cor-de-rosa

A Barbie faz parte da infância de muitos e traz, em seus muitos formatos, o sentimento de nostalgia. Intensificado por millennials e pela Geração Z, o saudosismo desempenha um papel importante na cultura ao trazer à tona elementos do passado, evocando conexões emocionais estabelecidas há anos.


Voltado ao público infanto-juvenil, o site da Barbie era “febre” nos anos 2000 e disponibilizava diversas atividades lúdicas (Foto: Divulgação)

Nesse sentido, o retorno da Barbie aos holofotes pode ser, para muitas pessoas, uma espécie de volta ao passado, trazendo sensações há muito adormecidas. As marcas já perceberam isso e aproveitaram o momento para unir o nome da boneca a uma sensação muito presente no cotidiano. 

“A nostalgia é um sentimento poderoso e tem sido a grande aposta de vários produtos e marcas. [A futurista] Faith Popcorn há décadas lançou um livro sobre tendências, desenvolvido a partir de uma pesquisa com 4.000 indivíduos. Na obra, identificou 16 macrotendências e dentre elas já estava a volta ao passado. Ou seja: as pessoas se conectarem com sua infância, a pureza e leveza de suas vidas em outros tempos”, finaliza a professora Renata.