seg, 4 outubro 2021 10:45
Entrevista Nota 10: Alessandra Oliveira e a busca por uma educação que prioriza o diálogo
Professora dos cursos de Comunicação da Unifor é autora do livro infantil “Ester Conhece Paulo Freire”
Desde 2009, a atuação em sala de aula como professora é um dos principais ambientes de descoberta da docente do Centro de Comunicação e Gestão (CCG) da Universidade de Fortaleza, Alessandra Oliveira, mestra e doutora em Educação. Em 2021, ano do centenário do educador e filósofo pernambucano Paulo Freire (1921-1997), a professora Alessandra aventurou-se por novas possibilidades de ensinar e de aprender, de perguntar e de dialogar.
As páginas ilustradas do livro infantil foram o espaço escolhido pela autora para falar do que a inspira e para abordar o tema sobre o qual tem se debruçado profissionalmente: a educação. A estreia como autora infantil veio com “Ester conhece Paulo Freire”. Lançada em julho de 2021, a obra traz uma aluna, Ester, que se deixa ser vista por uma professora, Dalva.
A relação entre as duas personagens cujos nomes remetem às estrelas é permeada pelos ensinamentos do professor que foi declarado patrono da educação no Brasil em 2012 e que também é o pensador brasileiro mais citado no exterior. De forma lúdica, os leitores de todas as idades tomam contato com o legado do autor que sempre valorizou as perguntas, o diálogo e a práxis para que educando e educador alcançassem o “ser mais”.
Alessandra Oliveira participa da programação do Mundo Unifor com a palestra “Paulo Freire para todas as idades, debate sobre o livro Ester conhece Paulo Freire”, que será realizada no dia 20 de outubro, das 17h às 18h.
Com exclusividade para o Entrevista Nota 10, a professora que dá aulas para graduandos de Publicidade e Propaganda e Jornalismo explica como a experiência da maternidade a estimulou a escrever para crianças e o que espera dessa nova vivência. Confira a seguir:
Entrevista Nota 10 - A senhora é mestra e doutora em Educação e dá aulas para universitários desde 2009, como a sua vivência em sala de aula dialoga com essa estreia como autora infantil e com o lançamento do livro “Ester conhece Paulo Freire”?
Alessandra Oliveira - "Ester conhece Paulo Freire" descreve uma experiência de aprendizagem em que a professora Dalva usa conceitos importantes de Paulo Freire para instigar a participação e a ampliação da visão de mundo dos educandos. Essa é minha busca como professora, construir uma educação significativa, impulsionadora de mudanças de vida e da própria sociedade. A escolha de Paulo Freire e de um ambiente de aprendizagem para compor a história dialogam com minha jornada de pesquisa e com minhas escolhas profissionais. Acredito que a escrita é um ato de afeto, então, eu precisava escrever sobre o que amo.
Entrevista Nota 10 - O papel da professora Dalva, baseada nos ensinamentos de Freire, é fundamental para estimular as descobertas da protagonista Ester, uma criança em idade escolar. Poderia explicar como surgiu esse desejo de contar história para crianças?
Alessandra Oliveira - Escrevi o primeiro esboço do livro amamentando meu filho Jonas, durante minha licença maternidade. Eu queria apresentar ao meu filho as pessoas das quais eu mais gostava. Foi assim que resolvi escrever sobre Paulo Freire, mas queria que fosse de uma forma lúdica, em que os conceitos pudessem ser vivenciados no lugar de explicados. Lembrei, então, de uma professora que tive, que também se chamava Dalva, e que foi tão importante em minha trajetória que, sem dúvida, merecia essa homenagem.
Entrevista Nota 10 - Comemoramos em 19 de setembro o centenário de Paulo Freire, patrono da educação no Brasil. Qual sua expectativa em relação a ajudar, como professora, comunicadora e escritora, que mais brasileiros conheçam de forma mais profunda a relevância desse educador?
Alessandra Oliveira - Estudo Paulo Freire desde a graduação e já falei muito sobre os seus conceitos em textos acadêmicos que publiquei, apesar de ser muito válido falar sobre esse autor tão importante para a educação no meio acadêmico, sempre achei que todas as pessoas deveriam conhecê-lo. Afinal, sua proposta fala de uma nova educação e também de uma postura ética diante da vida. Então, eu busquei ser essa pessoa que escuta o outro, que tem uma amorosidade pelos educandos, que tem uma compreensão de que aprendemos sempre e também com uma abertura para o diálogo. Todos os estudantes que passaram por mim, de certa forma, conheceram Paulo Freire pela minha prática. Acho essa uma forma bonita de apresentá-lo. O livro "Ester conhece Paulo Freire" também tem esse objetivo de mostrar, por meio da prática de uma professora, conceitos importantes de Paulo Freire, busquei fazer isto de forma lúdica e bem simples, para que todos pudessem compreender e também sentir.
Entrevista Nota 10 - Paulo Freire já dizia “que não existe ensinar sem aprender” e que não se deve ensinar “como um burocrata da mente, mas reconstruindo os caminhos de sua curiosidade”. Como avalia que as descobertas sobre o prazer de ler e os estímulos a essa prática na educação infantil podem ser determinantes para, futuramente, formar jovens mais instigados a aprender de forma contínua e crítica?
Alessandra Oliveira - A leitura é uma janela para vários mundos, criar o hábito de ler é continuar instigando sua curiosidade ao longo da vida e sua imaginação também. As crianças amam livros, nunca podemos ler uma história uma única vez, elas gostam de repetir, de decorar, de recontar. Ler para uma criança é um ato de amor, de partilha, que irá ser fundamental para que ela crie essa boa relação com os livros. Paulo Freire falava que "a leitura do mundo precede a leitura da palavra", primeiro aprendemos a ler as árvores, o vento, a joaninha, a formiga, depois vamos fazendo relações com outros contextos e começamos a contar nossas histórias. Ler e escrever são caminhos que se cruzam e geram um trabalho reflexivo fundamental para o movimento da vida. Como viver sem pensar sobre o vivido, sem ver novamente, por meio da leitura, para buscar formas de entender e mudar o futuro?
Entrevista Nota 10 - Em sua avaliação, como a Universidade e o Jornalismo podem contribuir para “mudar pessoas que transformam o mundo”, como propunha Paulo Freire?
Alessandra Oliveira - Quando eu escolhi ser jornalista foi porque eu queria mudar o mundo, e depois, lendo Paulo Freire e outros autores como Jesús Martín-Barbero, fui compreendendo a força da palavra, da denúncia. Um jornalista precisa, antes de tudo, ser um bom ouvinte, entender que cada notícia é repleta de versões e colocar essas versões para dialogar, como já propunha Paulo Freire na educação dialógica, para fazer um paralelo entre educação e comunicação. Acredito que o papel da universidade não seja oferecer respostas, mas nos levar a construir perguntas. O olhar crítico pode ser apurado ao longo do curso, por meio das disciplinas, leituras e atividades práticas, mas também deve estar presente em tudo na vida. O jornalista deve ser aquela criança que não aceita um "porque sim" como resposta.