seg, 3 novembro 2025 18:01
Petróleo na Amazônia: qual o limite entre soberania energética e preservação ambiental?
A empresa Petrobras dará início a perfuração de poços no litoral do Amapá para ampliar a produção de combustíveis fósseis, responsáveis por mais da metade dos gases que aquecem o planeta

Com a proximidade da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 30) — evento que reunirá líderes globais, de 10 a 21 de novembro de 2025, para discutir as crises ambientais do Brasil e de outros países —, uma decisão governamental reacendeu o debate entre interesses econômicos e ética ambiental: o aval para a exploração de petróleo na Amazônia.
Sob a aprovação do presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) autorizou a Petrobras a iniciar pesquisas e perfurações de poços em alto-mar, no bloco 59 da Bacia da Foz do Amazonas. A região é considerada sensível, abrigando rica biodiversidade e diversas comunidades indígenas que podem ser afetadas pela exploração.
O interesse pela exploração de petróleo na região é antigo. Ainda na década de 1970, foram realizadas as primeiras investigações em águas rasas, mas os resultados apontaram apenas pequenas quantidades do recurso. Em 2025, as pesquisas avançaram para áreas mais profundas, com a expectativa de encontrar reservas mais significativas que possam contribuir para a transição energética.
A seguir, os docentes Sheila Cavalcante Pitombeira, do curso de Direito da Universidade de Fortaleza — instituição mantida pela Fundação Edson Queiroz —, e Paulo Henrique Pereira, do curso de Energias Renováveis, analisam os possíveis riscos ambientais e jurídicos envolvidos nesse processo.
O que diz o Direito Ambiental sobre a exploração de petróleo na Foz do Amazonas?
Mestre em Ciências Marinhas Tropicais e doutora em Desenvolvimento e Meio Ambiente, Sheila destaca que a legislação brasileira possui um arcabouço robusto de normas que buscam conciliar o desenvolvimento econômico e a proteção ambiental.
Ela lembra que a Constituição Federal, a Lei do Petróleo (nº 9.478/1997) e a Política Nacional do Meio Ambiente (nº 6.938/1981) impõem limites e exigem estudos rigorosos para atividades de alto impacto, como é o caso da exploração petrolífera.
“A exploração de petróleo no Brasil, especialmente em áreas ambientalmente sensíveis como a foz do Amazonas, é um tema complexo que envolve múltiplas camadas de regulamentação e inúmeras de proteção e prevenção de proteção do ambiente contra acidentes e danos ambientais. É fundamental que as empresas e o governo atuem em conformidade com as leis para minimizar os impactos ambientais” — Sheila Pitombeira, procuradora de Justiça e docente do curso de Direito da Unifor
Segundo a professora, a região abriga ecossistemas únicos, como recifes de corais de águas profundas, manguezais e espécies marinhas pouco estudadas, o que torna a exploração uma operação de risco elevado. “A poluição e as mudanças no ecossistema aquático podem afetar a abundância e a diversidade das espécies de peixes e contribuir para a poluição da água por conta de derramamentos de óleo”, alerta.
Entre os riscos diretos e indiretos, Sheila cita:
- derramamento de óleo,
 - lançamento de efluentes químicos,
 - fragmentação de habitats,
 - poluição sonora decorrente das atividades de perfuração.
 
Esses impactos, segundo ela, podem gerar efeitos em cadeia sobre a fauna, a flora e a subsistência das populações humanas locais.
A jurista ainda ressalta que o Ibama já havia indeferido a licença de exploração em 2023 e 2024 por falhas técnicas no plano de emergência e na avaliação dos riscos ambientais. Agora, em 2025, a autorização foi concedida para o bloco FZA-M-59, mas Sheila pontua que há alegações de ilegalidades no processo e de pressão política sobre os órgãos técnicos.
Para a docente, a decisão também contrasta com os compromissos internacionais do Brasil. “O país é signatário do Acordo de Paris, que busca reduzir as emissões de gases de efeito estufa. Autorizar a exploração de petróleo em plena preparação para sediar a COP30 é uma contradição evidente”, afirma.
A Foz do Amazonas ainda passa por processos de contagem e catalogação de espécies por se tratar de uma região pouco explorada e com vasto potencial ecológico (Foto: Getty Images) 
Ela também questiona a falta de transparência e de participação social no processo de licenciamento. Segundo a professora, as comunidades tradicionais da região não foram consultadas previamente, em desrespeito à Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que garante a consulta livre, prévia e informada. “Ignorar o direito dessas populações é comprometer a legitimidade e a ética de qualquer empreendimento”, reforça.
Em caso de acidente ambiental, como um vazamento de óleo, Sheila explica que a responsabilidade da empresa é objetiva e integral, o que significa que a Petrobras deve reparar todos os danos, independentemente de culpa. O Estado também pode ser responsabilizado subsidiariamente, caso haja omissão na fiscalização.
Por fim, a professora defende que o Direito Ambiental deve atuar como mediador entre progresso e preservação. “A conciliação entre desenvolvimento energético e proteção ambiental não é apenas possível, é necessária para garantir soberania, justiça climática e o futuro das próximas gerações”, conclui.
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Soberania energética para além do petróleo
Do ponto de vista técnico, o professor Paulo Henrique Pereira, do curso de Energias Renováveis da Unifor, reconhece que há uma lógica estratégica na busca por autossuficiência energética, mas pondera que a exploração de petróleo na Foz do Amazonas não representa uma solução sustentável.
“Do ponto de vista estratégico, manter capacidades domésticas de produção de petróleo reduz vulnerabilidades externas. Mas a soberania energética não se alcança apenas com reservas, é preciso investir em infraestrutura, refino, armazenamento e transição para baixo carbono”, analisa o doutor em Engenharia Elétrica.
Ele destaca que o Brasil é uma das nações com maior potencial de energias limpas, especialmente na geração solar, eólica e de biomassa, mas ainda enfrenta barreiras estruturais. “Temos uma oferta imensa de energia renovável no Nordeste, mas a falta de investimentos em transmissão e armazenamento faz com que parte dessa energia seja desperdiçada”, explica.
Paulo Henrique menciona o fenômeno do curtailment, que ocorre quando usinas eólicas e solares são forçadas a reduzir sua produção por falta de infraestrutura de escoamento. “Isso representa prejuízo bilionário para o setor de renováveis. A exploração [do petróleo] pode atrasar a transição [energética] se for tratada como fim em si mesma. Se as receitas e a governança forem usadas estrategicamente, ela pode coexistir com uma transição acelerada”, afirma.
Na visão do professor, o investimento em novos blocos de petróleo pode atrasar a transição energética brasileira, desviando recursos e foco regulatório de áreas estratégicas. “O esforço regulatório e os incentivos fiscais por parte dos governos são fundamentais para o florescimento da produção de hidrogênio verde no Brasil e outras matrizes energéticas”, ressalta.
Integrante da Cooperativa Energias Renováveis do Nordeste (COODENSOL), ele lembra que a matriz elétrica brasileira já é 88% renovável, mas a matriz energética, que inclui transportes e indústrias, ainda é fortemente dependente de combustíveis fósseis. “O desafio agora é levar a transição para esses setores, com biocombustíveis, e-combustíveis e hidrogênio verde”, pontua.
Paulo Henrique também comenta o potencial energético da Amazônia, destacando que a região tem grande capacidade de produção de biomassa, mas tem limitações para geração solar de larga escala devido à alta umidade.
“A biomassa sendo explorada de forma sustentável, aproveitando os resíduos gerados, realizando manejo florestal certificado e uso de agroflorestas integradas, pode gerar empregos e renda local com baixo impacto ambiental”, observa. Na sua avaliação, insistir em expandir a exploração de petróleo vai na contramão dos compromissos climáticos do Brasil.
“Projetos de energias renováveis e armazenamento geram menos impactos por tonelada de CO₂ e trazem mais benefícios locais. Em longo prazo, são social e economicamente mais vantajosos do que ampliar a produção de petróleo offshore” — Paulo Henrique Pereira, mestre em Engenharia Nuclear e docente do curso de Energias Renováveis da Unifor
Entre o progresso e a preservação
A exploração de petróleo na Foz do Amazonas expõe o dilema entre crescimento econômico e responsabilidade ambiental. Para os especialistas Paulo Henrique Pereira e Sheila Pitombeira, a decisão do governo federal deve ser acompanhada com cautela, priorizando a ciência, a transparência e a proteção dos ecossistemas amazônicos.
Enquanto o Brasil busca garantir sua soberania energética, o desafio é fazê-lo sem comprometer o equilíbrio ambiental e a credibilidade internacional do país em um momento decisivo para o futuro do planeta.
Formação profissional com foco em sustentabilidade energética
Paulo Henrique destaca que a Universidade de Fortaleza Unifor tem tido uma contribuição importante na formação de profissionais e no desenvolvimento de pesquisas em energias limpas. “No Grupo de Pesquisa em Eletrônica de Potência e Energias Renováveis (GEPER), trabalhamos com soluções baseadas em hidrogênio verde, buscando torná-lo financeiramente mais viável”, explica.
O professor também menciona outro Grupo de Estudos Tecnológicos (GET), o RenewTech, coordenado por Rodrigo Alves Patrício, docente do curso de Energias Renováveis. O grupo desenvolve o projeto “Estação de análise de gases para biodigestores com arduino e sensores”, voltado à criação de soluções tecnológicas e sustentáveis.
Ele finaliza com um convite: “Quem tem interesse nesse tema pode visitar nossos laboratórios, participar dos grupos de pesquisa e contribuir para o avanço das tecnologias que vão moldar o futuro energético do país”.
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Esta notícia está alinhada aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU), contribuindo para o alcance do ODS 7 – Energia Limpa e Acessível, ODS 13 – Ação Contra a Mudança Global do Clima e ODS 14 – Vida na Água.
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