Advogados ganham destaque nas redes sociais compartilhando conhecimentos jurídicos

qua, 15 julho 2020 10:12

Advogados ganham destaque nas redes sociais compartilhando conhecimentos jurídicos

Egressos e docentes de Direito da Universidade de Fortaleza atraem público nas plataformas virtuais por meio da disseminação de conteúdos


Advogado e especialista em Marketing Jurídico, Pedro Henrique Oliveira é fundador da página Nação Jurídica (Foto: Divulgação)
Advogado e especialista em Marketing Jurídico, Pedro Henrique Oliveira é fundador da página Nação Jurídica (Foto: Divulgação)

Sua excelência, a Internet, absolveu a Justiça de seu pecado capital: o encastelamento. Assim é que, nas redes sociais, não faltam likes para assuntos jurídicos. E se o Direito é pop, isso se deve a quem toma para si a tarefa de simplificar-lhe a retórica, aproximando e relacionando a tábua fria das leis com o mais banal cotidiano do homem comum. É o que fazem os advogados e as advogadas que adotaram como ferramenta de trabalho e também de ensino-aprendizagem as plataformas digitais, ao mesmo tempo em que conquistaram uma legião de seguidores fiéis de diferentes procedências. Ao produzir e difundir conteúdos técnicos em linguagem coloquial, egressos e docentes da Universidade de Fortaleza (Unifor), instituição da Fundação Edson Queiroz, fazem do ambiente digital um repositório de ideias, mas também de sentimentos sobre o que se entende como justo ou injusto nas sociedades.   

A web veste toga

Cursos virtuais, mentorias à distância, organização remota de congressos jurídicos, simulações online das provas da OAB. Tudo isso e mais o inusitado dos bastidores do mundo jurídico vêm atraindo cada vez mais olhares nas redes sociais. Basta ver o post no qual o advogado especialista em Marketing Jurídico Digital, Pedro Henrique Oliveira, põe na berlinda curiosidades observadas no âmbito do próprio Supremo Tribunal Federal, como o episódio em que o ministro Gilmar Mendes absolveu uma mulher que furtou uma peça de picanha enquanto, no mesmo dia, sua colega de toga, Rosa Weber, negaria habeas corpus a um homem que embolsou um shampoo. Era a “deixa” que o fundador da página Nação Jurídica precisava para iniciar um debate virtual sobre furto famélico, termo técnico usado para designar o ato de quem furta por extrema necessidade ou para aplacar uma necessidade vital.

Egresso do curso de Direito da Universidade de Fortaleza (Unifor), o também presidente da Comissão de Empreendedorismo e Marketing Jurídico da OAB-Ceará criou o perfil Nação Jurídica no Facebook em 2012, sendo hoje seguido por mais de 800 mil internautas, número que se repete - e cresce proporcionalmente - no Instagram.  Aos 34 anos, o jovem advogado que usa as redes sociais para difundir informações “quentes”, como a que se refere à aprovação pela Câmara Federal da PEC que adia para novembro as eleições desse ano por conta da pandemia da Covid-19, também é aquele que usa de bom humor para sacudir a consciência dos próprios pares. Assim é que, em meio aos posts recentes, lê-se: “A conta está errada! Resolva o seguinte cálculo: 5 anos de faculdade, 100 noites de estudo para a OAB, R$ 260,00 de taxa de inscrição, R$ 900,00 de anuidade, uma hora no fórum, 30 minutos de trânsito. R$ 30,00 por uma audiência. Advogado, se valorize!”.

É o que tem feito. Ao disseminar conteúdo jurídico nas redes sociais para estudantes de Direito, advogados e demais interessados em temáticas afins, Pedro Henrique não só se autovaloriza enquanto profissional do Direito como facilita o acesso a temas considerados herméticos. “Sempre procurei abordar os assuntos jurídicos de forma clara e objetiva, já que nem todos compreendem a linguagem rebuscada do Direito. E acho que, sobretudo por isso, após quase 8 anos, a página é muito reconhecida nacionalmente, como também em outros países. Temos informações de público em diversos países da África que falam a nossa língua, a exemplo de Angola. O site Nação Jurídica também é bastante visitado, com centenas de milhares de visitantes-mês. Penso que hoje  é imprescindível o uso das redes sociais em qualquer profissão.Vivemos a era da street relations, que remete às relações pessoais nas ruas, mas as e-relations, ou seja, as relações através da internet e das redes sociais tendem a crescer pós-pandemia. É via redes que devemos nos adaptar ao novo normal”, projeta.  

Nas redes, assim como nas ruas, claras mudanças de paradigmas. Para Pedro Henrique, a moeda do século XXI não é mais o tempo.  “Tempo todos têm. Basta observar a quantidade de horas em que ficamos conectados em aplicativos de mensagens, redes sociais e na própria internet. A moeda de hoje é a atenção”, frisa. Na corrida por atrair e prender olhares, a criatividade se tornou a principal expertise de quem busca lugar de destaque seja como produtor ou disseminador de conteúdos. E o alerta vale para quem também se dedica à docência.  “O docente precisa, cada vez mais, utilizar não apenas o conhecimento adquirido ao longo dos anos de estudo, mas inovar na forma de compartilhar aquele conteúdo. Temos uma poderosa ferramenta em mãos, mas deve haver um esforço contínuo para melhor saber usar, o que também significa aprender a filtrar conteúdos inverídicos, as chamadas fake news. Isso se converte em credibilidade diante do público almejado”, acredita.  

Para inovar e manter a popularidade, há de se ler a cartilha nunca escrita, mas assimilada na prática, que diz sobre o modus operandi na web. E ele ensina: “o tipo de conteúdo e o meio de divulgação a serem escolhidos dependerão da área em que você atua. É interessante observar onde está o seu público para que o conteúdo certo seja disponibilizado, lembrando que as redes sociais atuam de forma diferente e têm públicos diversos. No Facebook, há um tempo maior para a leitura de informações. Já no Instagram é algo mais rápido, textos curtos nas imagens, vídeos de até 1 minuto, porque além disso ninguém vê. Como meu intuito é compartilhar conhecimento, tenho que entender essa dinâmica e saber onde e como será melhor oferecer algum curso, mentorias, palestras... e assim, além de transmitir conteúdo de relevância, ter retorno financeiro com o trabalho diário nas redes sociais”. 

Foram as demandas e dúvidas trazidas por inquietos estudantes de Direito que levaram o advogado e professor da Universidade de Fortaleza (Unifor), Marcelo Magalhães, a criar um canal remoto de comunicação para tratar sobre assuntos jurídicos extra-muros. Nas redes sociais, escolheu assim a usar a própria imagem como docente para apoiar e dinamizar suas aulas, interconectando teoria e pensamento crítico com postagens de notícias do momento. “O que mais chama atenção dos estudantes são as questões que se tornaram polemicas na semana: no Direito Administrativo, por exemplo, denúncias de superfaturamento ou corrupção. Isso imediatamente viraliza nas redes sociais. Mas não devemos nos concentrar só nos assuntos da hora. As postagens não substituem as aulas, nem a pesquisa e nem o conteúdo aprofundado. O professor deve trazer assuntos relevantes mesmo que não estejam em pauta, analisando o novo junto a decisões jurisprudenciais antigas, além de permanecer antenado com conteúdos de valor e qualidade”, defende.

Para Marcelo, redes de conteúdos jurídicos são necessárias e úteis a fim de que os próprios professores possam afirmar-se como formadores de opinião. “Nós temos obrigação profissional e moral de certificar as informações, de evitar as fake news e sermos aliados valiosos dos políticos, jornalistas e outros formadores de opinião nesse combate que toda a sociedade organizada e livre deve fazer contra a distorção de verdades e mentiras propagadas nas redes sociais. As notícias falsas precisam ser combatidas por pessoas que têm conhecimento técnico e são capazes de difundir informações certificadas”, sublinha. Em sala de aula, o professor dá o recado adaptando a proposta didática e as metodologias utilizadas não só de acordo com o meio como também em sintonia com o comportamento de seus seguidores. “O estudante de Direito nas redes sociais quer informação rápida e objetiva. Textos longos, tô fora! Faço esquemas com vários tipos de posts, um complementando o outro, numa sequencia lógica, como se fosse um seriado: normalmente são dez capítulos sobre aquele tema. E assim vou aprofundando o debate, sem fazer pesar”, ensina.     

Extensão das aulas presenciais, as redes sociais são pistas de pouso interativas inclusive para questões que ainda pairam no ar e esperam respostas, como o primeiro serviço público sem fronteiras e universal em processo de construção para garantir, no futuro, a vacinação da Covid-19 em todo o planeta. “A internet funciona como nosso repositório de memória e deve ser acionada em sala de aula para pensar o presente e projetar o futuro. Esse é o exercício da docência que me interessa e deve primar pela leveza. Ou seja, posso postar um olhar diferenciado sobre o filme “Roma”, tomando-o como leitmotiv para fazer uma reflexão sobre a exploração abusiva da imagem de mulheres e meninas na internet como também interagir com quem me segue trazendo a público minhas próprias dúvidas. Nesse período de isolamento social, por exemplo, cheguei a postar: “gente, ajuda: onde coloco lives, e-book, mentoria on line e legal coaching no lattes?”, ilustra. 

Elas no ciberespaço

O protagonismo feminino no meio jurídico também se propaga em megabytes. Há pouco mais de dois anos, a advogada, professora e coordenadora da pós-graduação em Processo Civil da Universidade de Fortaleza (Unifor), Vládia Feitosa, abriu o Instagram pessoal para tratar de assuntos jurídicos, voltando o foco para o que chama de “um reforço de autoridade” na área em que atua: o Direito das Famílias. Hoje, contabiliza 8.821 seguidores, sendo a maioria mulheres. E não à toa. A vice-presidente da OAB e membro da Comissão da Mulher Advogada optou por usar a ferramenta para falar especialmente às mulheres, cercando demandas próprias do universo feminino e tomando para si, como mulher e profissional, bandeiras de luta que ainda precisam ser legitimadas. “Nada melhor do que uma mulher para falar de assuntos relacionados às mulheres. Deliberadamente, quero que elas se vejam nessas postagens e nas informações que tento levar para, de alguma forma, apoiá-las em suas decisões e reivindicações”, aferra. 

Para falar com seus pares nas redes sociais, Vládia Feitosa também se mostra em seus múltiplos papéis de mãe, esposa, docente e advogada. "Se sou tudo isso em uma só mulher não há necessidade de separar essas vozes em diferentes perfis ou plataformas. Até porque o que faço é o que o nosso código de ética permite: um marketing de conteúdo. Mas não passei a fazer isso do dia para a noite ou de qualquer jeito. Hoje, conto com toda uma equipe por trás do meu Instagram, que faz as artes, a edição de vídeo e que pensa junto comigo o conteúdo, a partir de um levantamento de notícias. O conteúdo técnico, específico da área de Direito, assim como a revisão de todos os textos, isso sim é totalmente por minha conta. E se 95% das minhas clientes é de mulheres nas redes essa adesão e esse feedback não poderiam ser diferentes. Humanizando o meu perfil é que penso ter atraído tantas seguidoras”, afirma.  

Um conteúdo formatado de dentro para fora. Segundo Vládia, são as dúvidas reais, ouvidas cotidianamente no próprio escritório de advocacia, que têm gerado os posts de maior repercussão em seu Instagram. Assim é que, a partir de simples perguntas, complexos esclarecimentos vêm à tona: “como ficam as visitas e os deslocamentos de pais e filhos que têm guarda compartilhada no período de isolamento social? É possível divorciar-se em meio à pandemia? Pai pode descontar presente do valor da pensão? Como proteger um patrimônio particular durante o casamento?”. Em meio a respostas técnicas, há ainda espaço para as postagens poéticas, como a live especial em que músicas de Chico Buarque foram utilizadas para lançar luz sobre matérias próprias do Direito da Família. 

Capítulo à parte, a prática da docência via redes sociais é outro exercício em alta. “Tem o lado jurídico falando mais alto sim, mas a docente ganha cada vez mais espaço. Então, estão lá o meu dia a dia como gestora educacional, as aulas online, as ferramentas que uso em sala de aula, os convidados, os eventos. E assim meu Instagram como um todo passa a servir aos alunos e alunas. Não à toa, muitos me seguem, justamente porque aprendem com o conteúdo que disponibilizo. E penso que mais do que nunca a docência tem que entrar no mundo digital. É um caminho sem volta. E só consigo ver pontos positivos, tanto na advocacia quanto na sala de aula: muitos dos meus clientes vieram pelo Instagram, muitos dos meus alunos passaram a se interessar e pesquisar certos temas a partir do que acessaram ali”, ilustra Vládia. 

Atuação profissional, vida pessoal. Em seu Instagram, a advogada e professora-doutora da graduação e do Mestrado Profissional em Direito e Gestão de Conflitos da Universidade de Fortaleza (Unifor), Darlene Braga Monteiro, também não separa uma live sobre segurança jurídica ou desburocratização de serviço registral imobiliário dos posts ligados à sua prática de atividades físicas ou aos projetos sociais onde atua voluntariamente como cidadã comum. Tudo porque são múltiplos os lugares de fala de quem também está à frente da Secretaria Municipal da Regional VI de Fortaleza. “Como gestora, uso as redes sociais para dar transparência às ações e projetos governamentais em curso, quase como uma prestação de contas online. Como docente, procuro informar sobre oportunidades de capacitação, a importância do estudo contínuo e as atualizações legais. E, como mulher, me mostro exatamente como sou, compartilhando o meu dia a dia. Nas redes, quando tudo isso se mistura, você pode construir uma imagem de autoridade sobre determinado assunto jurídico ou ser encarada simplesmente como uma advogada fitness. E é essa diversidade de olhares que acho interessante”, opina. 

Janelas abertas, portanto. Enquanto a gestora decide dar visibilidade ao Plano Diretor Participativo de Fortaleza, a docente divulga nas redes o projeto Direito Imobiliário por Minuto, uma coletânea de vídeos desenvolvidos pelos alunos da disciplina de Direito Imobiliário do Curso de graduação em Direito da Unifor. Diversos, os temas jurídicos que se sucedem também geram feedbacks singulares. “No início, as postagens relacionadas às ações da Regional acumulavam críticas e reclamações, mesmo quando a notícia era positiva. Depois, com a constância das publicações e ao mostrar o fluxo dos trabalhos, passaram a ser elogiadas e apoiadas. As pessoas passaram a interagir com a gente de uma forma não agressiva. Não porque os problemas ou demandas deixaram de existir, mas por se sentirem mais próximas da gestão e com acesso mais direto às informações do âmbito governamental”, observa Darlene. 

Na prática da docência, ela destaca, as aulas online exigiram criatividade. Além de criar um avatar, personalizando a própria página e o material didático, a professora-doutora convidou profissionais de diferentes regiões e áreas de atuação no Brasil para incrementar os debates no ambiente virtual da Unifor. Assim, manteve a atenção e interesse dos discentes em alta, apesar do distanciamento social causado pelo novo coronavírus. “Nesse semestre, o WhatsApp também foi uma ferramenta muito eficaz, visto que a comunicação é rápida e não exige uma internet de alta qualidade.  É certo que os alunos já estão familiarizados com as redes sociais, o que é uma grande vantagem, mas o professor ainda precisa fazer o direcionamento do conteúdo, sugerindo filtros e evitando a dispersão. Como eu já estava íntima das mídias digitais, não tive dificuldades nisso. Ao contrário. Acabei sendo convidada para ministrar aulas em uma pós-graduação no Piauí e, em paralelo, no curso de Juízes da ESMEC, a minha disciplina foi a primeira remota nesse período de quarentena. Certamente, fui lembrada sobretudo pela performance midiática que me habilitou para as atividades remotas”, acredita.     

Darlene Braga começou a utilizar as mídias sociais quando se candidatou a desembargadora, em 2010. Hoje, se orgulha de ter 17 mil seguidores no Instagram, três mil no Twitter e 15 mil no Facebook. “Fui ganhando a confiança das pessoas. Por isso, sempre procuro usar as redes sociais para influenciar positivamente e de forma ética, seja através do exercício profissional ou mesmo da exposição da minha vida pessoal. Acho que mais até do que o conteúdo técnico o que mais atrai meus seguidores é ver que a advogada e docente que debate o Direito Imobiliário e está a serviço do Município é a mesma que se dedica ao treino para corridas e pratica a responsabilidade social, mobilizando doações e apadrinhamentos para projetos como o 'Adote um Atleta', do Poço da Draga. Tudo isso gera posts e debates em minhas redes, justamente porque diz muito sobre os meus valores e assim se converte em capital simbólico, algo importante para uma digital influencer”, encerra.