Entrevista Nota 10: Naza McFarren e a arte em meio à natureza

seg, 12 junho 2023 18:34

Entrevista Nota 10: Naza McFarren e a arte em meio à natureza

Artista plástica piauiense radicada nos Estados Unidos, ela fala sobre a carreira como pintora, explica como surgiu seu estilo único e conta detalhes sobre a exposição “Naza na Natureza”


A mostra está em cartaz no campus da Universidade de Fortaleza e virtualmente no Espaço Cultural Unifor (Foto: Ares Soares)
A mostra está em cartaz no campus da Universidade de Fortaleza e virtualmente no Espaço Cultural Unifor (Foto: Ares Soares)

No último dia 5 de junho, o campus e o Espaço Cultural da Universidade de Fortaleza, instituição de ensino da Fundação Edson Queiroz, deram as boas-vindas para a exposição “Naza na Natureza”, da artista plástica piauiense radicada nos Estados Unidos, Naza McFarren.

A mostra “veste” os troncos de 20 árvores com arte em tecido, elástico e respirável, criada especialmente para elas. Pinturas de animais em risco de extinção saúdam o visitante ao nível dos olhos, e extensões delas continuam acima (até cinco metros de altura), abaixo e nas laterais.

“Precisava de alguém no lugar certo para acreditar nisso”, comenta a artista sobre a parceria com a Unifor. Ela já havia realizado o feito em escala bem menor, mas sonhava em conseguir apoio para fazer isso em grande escala. O que funcionou de forma perfeita no campus amplamente arborizado da instituição.

Naza estudou em várias partes do Brasil e, aos 21 anos, começou sua carreira artística em Brasília. De lá, foi para Campo Grande, Fortaleza e Recife, sempre pintando e expondo seu trabalho, inclusive no Museu de Arte de São Paulo (MASP). 

Chegou a morar no Panamá, onde foi contratada para pintar a família Noriega em meio às turbulências pré-guerra do final da década de 1980. Em 1985, mudou-se para os Estados Unidos, onde a pintora começou a desenvolver seu estilo particular, intitulado abstracted realism.

Nos anos 1990, abriu um ateliê/galeria e se tornou conhecida por seu envolvimento com causas sociais e ambientais, tanto no condado de Palm Beach como em todo o sul da Flórida. Ela já foi escolhida para pintar um quadro que o presidente Barack Obama presenteou a então presidente brasileira Dilma Rousseff.

Sua arte foi publicada em diversos livros, revistas e jornais em várias línguas, inclusive livros didáticos usados em escolas dos Estados Unidos. Na Entrevista Nota 10 desta semana, Naza fala sobre a carreira como pintora, explica como surgiu seu estilo único e conta detalhes sobre a exposição “Naza na Natureza”.

Confira na íntegra a seguir.

Entrevista Nota 10 – Naza, poderia nos contar sobre como surgiu seu interesse pelas artes? Quando decidiu seguir carreira nessa área?

Naza McFarren – Eu gostava muito de desenhar desde que era criança. Minha irmã mais velha me deu algumas dicas básicas: como desenhar um nariz, um olho, o fato de que um nariz de frente não tem linhas e, sim, sombras e que um objeto mais longe fica menor do que um mais perto.

Entrevista Nota 10 – Em suas obras, o realismo e o abstracionismo se mesclam para criar pinturas únicas, combinando figuras visualmente bem definidas com elementos abstratos, que transformam o real em imagens cheias de sentimento e um tom quase onírico. Como esse estilo marcante foi desenvolvido? Você teve referências importantes ao longo do caminho que te ajudaram a chegar em sua “marca registrada”?

Naza McFarren – Desde o começo da minha carreira, evitei conhecer o trabalho de outros artistas porque eu queria desenvolver meu próprio estilo, minha linguagem livre de influências. Só depois de anos, quando já sentia segurança, foi que passei a ler sobre história da arte e sobre outros artistas. Meu estilo foi se desenvolvendo aos poucos, por meio de experimentos que ia fazendo.

Muito cedo comecei a usar a tinta de forma muito líquida, utilizando um molambo e a ponta dos pincéis limpos e úmidos para ir retirando parte da camada de tinta, controlando os claros e escuros e, ao mesmo tempo, conseguindo uma luminosidade similar a de aquarela. A época em que mais experimentei com materiais novos foi entre 1988 e 1996, período em que vivi na área de Washington DC, Fayetteville, North Carolina e Boca Raton, na Flórida. A partir daí, o estilo estava consolidado.

A evolução para o digital aconteceu quando me dei conta de que, depois de treinar por milhares e milhares de horas durante 14 anos no Photoshop, eu tinha adquirido a capacidade de criar minha arte usando os pincéis do computador para pintar e dar a mesma ilusão de textura, transparências e leveza. De qualquer maneira, sempre tenho uma tendência a inovar. Vivo com um pé no futuro. Quando pouca gente sabia o que era a internet, comprei meus domínios (naza.com, naza.net e naza.org), construí websites em cada um e passei a atuar mais online do que ao vivo. E fiz a primeira encomenda de arte na história da internet.

Entrevista Nota 10 – Um assunto recorrente em sua arte é a natureza. São diversas obras retratando os mais variados animais, especialmente aqueles ameaçados de extinção. Por que falar sobre esse tópico em suas pinturas? De que forma a expressão artística pode colaborar com a discussão sobre proteção ambiental?

Naza McFarren – Eu comecei a pintar esses temas em meados dos anos 1990, quando vi que poderia dar minha contribuição para salvar o planeta usando minha arte como inspiração e alerta para as pessoas.

Entrevista Nota 10 – A premissa de mesclar o meio ambiente com a arte é ainda trazida à sua exposição “Naza na Natureza”, em cartaz no campus da Universidade de Fortaleza e no Espaço Cultural Unifor. Estampando 20 árvores com arte em tecido criada especialmente para elas, as obras retratam animais em perigo de extinção. De que forma surgiu e se concretizou a ideia dessa intervenção?

Naza McFarren – Eu tive a ideia de envolver os troncos de árvores há anos. Até fiz isso uma outra vez em pequena escala no Porto de Galinhas (RN), mas sonhava em conseguir apoio para fazer isso em grande escala. Foi a Unifor que acreditou na minha ideia.

Entrevista Nota 10 – Como está sendo essa parceria com a Unifor para realizar sua ideia em maior escala?

Naza McFarren – Está sendo magnífica. Sempre conheci a eficiência e a seriedade do pessoal da Unifor e de todos os times lá, mas, desta vez, ficou mais do que confirmado: recebi toda a atenção que podia desejar e de que precisei em todos aspectos, principalmente da Vice-Reitoria de Extensão e Comunidade Universitária (Virex) e do laboratório Vortex, que construíram a exposição em realidade aumentada no universo digital.

Realmente estou mais do que impressionada e grata. Durante a construção da exposição, e também depois, continuam dando todo o apoio. Nós passamos quase cinco meses preparando tudo em contato direto. Mesmo eu estando nos Estados Unidos (conversamos por Zoom, Google Meet e WhatsApp), tivemos muitas reuniões, trocamos muitas informações e deu certo! [risos] Acho que foi um sucesso. Agora mesmo estou indo para a Unifor encontrar com um pessoal que veio de Brasília. Estou muito feliz, muito satisfeita com a parte da Unifor também.

Entrevista Nota 10 – O que significa pra você, artisticamente, conseguir concretizar esse projeto?

Naza McFarren – Concretizar esse projeto é um ponto muito forte na minha carreira, no meu currículo. Não só porque é uma coisa inédita — ninguém jamais fez isso —, mas também porque estou em parceria com uma instituição de prestígio, que tem um compromisso muito sério com a arte e a cultura — isto é um fato conhecido nacionalmente. Isso faz muita diferença.

Entrevista Nota 10 – Outros temas recorrentes em seus quadros, os retratos são destaque não só pela qualidade do trabalho, mas também pelos nomes famosos representados: Ayrton Senna, Roberto Carlos e até Barack Obama. Na lista, ainda há figuras como a dona Yolanda Queiroz e Airton Queiroz — pintura que, inclusive, ilustrou a capa do livro sobre a trajetória do chanceler da Unifor. Como é hoje, após décadas e logo na celebração dos 50 anos da Universidade, voltar a se conectar com a instituição?

Naza McFarren – Nunca perdi contato com a Unifor. Sempre que venho à Fortaleza, uma das primeiras coisas que faço é visitar a instituição. Sinto um profundo respeito, amizade e admiração pelas pessoas que trabalham lá.