Sim, a Odontologia pode mudar a realidade social

qui, 22 outubro 2020 16:13

Sim, a Odontologia pode mudar a realidade social

Em alusão ao Dia Nacional do Dentista, celebrado em 25 de outubro, conheça profissionais que levam saúde bucal à população


As Clínicas Odontológicas da Universidade de Fortaleza realizam atendimento gratuito à população (Foto: Ares Soares)
As Clínicas Odontológicas da Universidade de Fortaleza realizam atendimento gratuito à população (Foto: Ares Soares)

No Dia Nacional do Dentista, comemorado em 25 de outubro, abrir a boca para dizer das boas novas no campo da prática odontológica é privilégio de poucas instituições de ensino, pesquisa e extensão do Brasil. Sorrindo abertamente, a Universidade de Fortaleza (Unifor), instituição vinculada à Fundação Edson Queiroz, ocupa lugar de destaque nesse pódio e tem muito o que repercutir em termos de projetos científicos com impacto social. 

São ideias transformadas em ações contínuas e respaldadas não só em sala de aula, mas sobretudo por meio do atendimento clínico de excelência que o curso de graduação em Odontologia disponibiliza gratuitamente à população em suas duas clínicas e 100 consultórios, hoje totalmente equipados para acolher demandas diversas ligadas à saúde bucal.

Especiais dentadas

A cada semestre, a ordem é trincar os dentes: tudo porque cabe aos professores-orientadores e estudantes anualmente envolvidos nos projetos de extensão do curso de Odontologia a tarefa conjunta de fortalecer procedimentos e especialidades que há muito ultrapassaram em complexidade o mero desafio estético encampado pelo dentista do passado, aquele que dizia respeito tão somente ao belo sorriso. À frente do Programa de Atendimento Multidisciplinar ao Paciente Especial (PAMPE), a professora Grace Sampaio é uma das que atuam de forma integrada junto a outras áreas de formação do Centro de Ciências da Saúde (CCS) em prol da saúde bucal. Seu público nas clínicas da Unifor é feito de crianças portadoras de alterações neurológicas e que podem sofrer com Síndrome de Down, autismo ou paralisia cerebral. 

“Esse trabalho começou no final dos anos 1990 no NAMI - Núcleo de Atenção Médica Integrada. Funcionava interdisciplinarmente com a ajuda de fisioterapeutas, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais etc... E já de início a demanda era grande, a ponto de chegarmos a ter mais de 600 pacientes, todos isentos de cárie, porque a saúde bucal das crianças foi enfim controlada. Quando em 2015 voltei para a Clínica de Odontologia esse atendimento continuou, sempre atraindo novos alunos e gerando um impacto muito positivo na formação deles desde o primeiro semestre, já que é ligado à disciplina de Clínica Infantil. Aliás, esse também é um trabalho pioneiro e isolado em um contexto mais amplo, por tratar justamente de pacientes com necessidades especiais. A estrutura da Universidade de Fortaleza e todo o apoio que sempre tivemos fizeram dele referência no estado, inclusive, já que certas síndromes só nós tratávamos e assim o PAMPE nunca parou”, comemora Grace, apontando 2020 como exceção à regra devido à pandemia do Covid-19. 

Ano a ano, ela comemora o aumento da participação dos alunos e alunas igualmente dedicados ao desdobramento gerado pelo PAMPE: o projeto mamãe-bebê. O foco que recai sobre bebês de 0 a 3 anos é o mesmo porque a professora considera que ambos os públicos requerem atendimento especial, independente de serem normo-sistêmicos ou não. “Unimos ao PAMPE porque os discentes queriam ter experiência tanto em odontopediatria como junto a pessoas especiais. Mas no começo não foi fácil emplacar a ideia, por anos a fio tive que fazer campanhas na mídia para introjectar na população um novo conceito: o de levar o bebê ao dentista. Muitas vezes, as mães iam para o atendimento e levavam os bebês porque não tinham com quem deixar. E assim a gente foi conversando com elas e tratando mães e bebês. E valeu a pena. Em 2016, montei o Mamãe e Bebê hospitalar, levando o projeto para o Hospital Geral de Fortaleza, onde venho trabalhando com bebês especiais ao lado de um grupo de alunos mais reduzido do Curso de Odontologia da Unifor.  E continua sendo apaixonante para todos e uma bandeira pra mim: unir o ensino aos cuidados com as crianças especiais”, reitera.

O êxito da escultura facial

A missão é “repor” um olho, um nariz, um lábio, uma orelha ou parte do rosto. Em 2020, o projeto de extensão Prótese da Face ou Proface completa 18 anos de existência. É motivo de orgulho para quem está à frente dele, a professora do curso de graduação em Odontologia Fátima Azevedo, e tem deixado boquiabertos docentes e discentes que colaboraram e colaboram com seus bons e reconhecidos resultados. Tudo porque beneficia com tratamento bucal especializado pessoas portadoras de deformidades buco-maxilo-faciais, sejam elas de origem genética ou congênita, como é o caso das fissuras palatinas ou lábios leporinos, mas também quando causadas por acidentes ou doenças como o câncer. 

Atualmente, segundo a professora, a maior parte das deformidades atendidas no projeto é de origem cancerígena, causadas justamente por remoção de tumores localizados nessas áreas. “Atendemos pacientes não só de Fortaleza, mas de outros municípios do Ceará e do Nordeste e Norte do País, então a abrangência social é grande, já que também se trata de um público economicamente frágil. É importante para a Universidade, porque está dentro dos propósitos da responsabilidade social e para o aluno-estagiário que aprende novas competências e passa a  enxergar o paciente dentro do aspecto biopsicossocial em que ele vive. Questões relacionadas à convivência social e à qualidade de vida desses pacientes com deformidades vêm à tona, já que eles se retraem e se escondem por se sentirem diferentes das outras pessoas. Portanto, o trabalho de professores e alunos também contribui com a reintegração social e fortalecimento da auto-estima dessas pessoas. O aluno se coloca no lugar do outro e se sente feliz porque pode ajudar”, observa Fátima. 

Detalhe importante: as próteses são confeccionadas, em sua grande maioria, pela própria equipe do Proface, sem a necessidade de gasto com laboratório especializado. Único projeto institucionalizado do Ceará se revela igualmente desafiador para quem aperfeiçoa habilidades para reestabelecer partes comprometidas ou destruídas da face, levando em conta seus aspectos anatômicos e funcionais. “São reabilitações de alta complexidade, portanto com um grau de dificuldade muito grande para se alcançar o maior grau de naturalidade possível. Por isso, o aluno tem que aplicar uma gama diversa de conhecimentos, não apenas relacionados à anatomia e fisiologia, mas também à estética e escultura facial. Por isso, nenhum discente fica menos de um ano no projeto que atende em média 60 pacientes por ano e a maioria de forma completamente gratuita”, aferra a professora.

Ciente da disciplina e rigor exigidos pelo projeto Proface, Fátima vê seus objetivos cumpridos: capacitar o aluno estagiário a diagnosticar, reabilitar e entender os aspectos biopsicossociais do paciente portador de lesões na face, cabeça, maxilares e boca; proporcionar assistência odontológica na área de prótese buço-maxilo-facial ao paciente portador dessas lesões; melhorar a qualidade de vida e possibilitar a reintegração social dos pacientes e estimular os discentes a aprofundar as pesquisas e apresentar trabalhos científicos em jornadas e congressos, discutindo criticamente temas polêmicos em bioética. 

Estresse entredentes

Adeus à cefaléia e às dores musculares próprias do sistema mastigatório. Resultado de uma feliz parceria que já dura cinco anos entre os cursos de graduação em Odontologia e Fisioterapia da Universidade de Fortaleza (Unifor), o projeto de extensão Odontologia e Fisioterapia na Disfunção Temporomandibular está vinculado a disciplinas de ambas as áreas de formação que mobilizam conteúdos complementares e interdependentes. “Temos uma média de 60 alunos envolvidos a cada semestre e juntos eles vem cuidando do tratamento da dor e da instalação de placas miorrelaxantes nos pacientes com desordem em nível articular ou mandibular”, apresenta o professor-orientador João Esmeraldo Frota Mendonça, do curso de Odontologia da Unifor. 

Com as atividades suspensas desde o início da pandemia da Covid-19, o projeto reserva aos alunos vinculados à Clínica Odontológica o desafio de moldar a placa miorrelaxante diretamente na boca do paciente, montando uma espécie de simulador de arcada dentária que seguirá para confecção em laboratório externo. Feito o dispositivo, professores e alunos cuidarão dos ajustes. “Na verdade são esses ajustes semanais na placa que irão garantir bons resultados, diminuindo ou cessando com as dores do paciente”, esclarece o professor que acolhe demandas vindas tanto do NAMI quanto diretamente da triagem realizada dentro do próprio Curso de Odontologia, o que já resultou em mais de 300 pacientes atendidos desde o início do projeto.

Dado novo: segundo Esmeraldo, a disfunção temporomandibular, que também pode ser causada por fatores de caráter emocional, tem atingido uma faixa-etária de menor idade. Isso pode ser constatado, ele afirma, quando sua incidência é analisada retroativamente e comparada aos cenários das décadas de 1980 e 1990. “O aumento do estresse na vida contemporânea fez com que pessoas entre 20 e 40 anos apresentem OTM, quando, no passado, prevalecia entre pessoas com 40, 50 anos. Portanto, não é à toa que o atendimento clínico integrado também envolve, além de profissionais da Odontologia e Fisioterapia, equipes de Fonoaudiologia, Neurologia e Psicologia”, esclarece o professor que, ao longo do ano de 2019, contabilizou a instalação de 25 placas miorrelaxantes e 40 pacientes atendidos. 

Volta GAPE!

Remoção de focos de infecção e adequação bucal. É do Centro Regional Integrado de Oncologia (CRIO) e do Instituto do Câncer do Ceará (ICC) que vem a maior parte das demandas abraçadas pelo Grupo de Atendimento a Pacientes Especiais (GAPE), projeto de extensão vinculado ao Curso de graduação em Odontologia da Universidade de Fortaleza. Respondendo pela coordenação de procedimentos especializados para o atendimento odontológico de pacientes oncológicos que passaram por radio e quimioterapia, ou mesmo por intervenções cirúrgicas causadoras de lesões bucais, o professor Assis Filipe Medeiros Albuquerque não se furta em abrir ainda mais o leque de seu público-alvo dentro das clínicas da Unifor. Mas, por enquanto, entende a pausa necessária diante da pandemia da Covid-19. 

“Pacientes cardiopatas, hipertensos, diabéticos, pessoas com insuficiência real crônica, fissuradas por conta de anomalias faciais ou sofrendo de alterações neurológicas, como autismo e Síndrome de Down, também são atendidos e tratados dentro do escopo do projeto e por isso é tão importante que ele volte com todo o fôlego a funcionar no ano que vem, mas isso só será possível quando tivermos todas as garantias de biossegurança e a permissão por decreto do Governo do Estado”, ressalta o professor que hoje orienta e trabalha com 24 alunos de modo on line, enquanto os atendimentos clínicos se reestabelecem. 

Segundo Assis Filipe, em cada semestre o GAPE atende em torno de 200 a 250 pacientes vindos das camadas mais pobres da população, realizando procedimentos que muitas vezes não estão acessíveis a quem vive em situação de vulnerabilidade social nem no âmbito público e nem no setor privado. Para ele, a importância se estende à própria qualidade da formação. “O estudante que vivencia essa experiência entra para o mercado de trabalho mais preparado e capacitado para atender pacientes com necessidades especiais. Não encontramos facilmente esse perfil e não há disciplinas específicas em geral ofertadas nos cursos de graduação ou pós-graduação em Odontologia. Nós, profissionais que trabalhamos em hospitais, atraímos essas demandas para as clínicas, certos de que a universidade tem condições de oferecer todo um suporte técnico, tecnológico e infra-estrutural. Mas ainda é uma área que precisa de mais investimento nos âmbitos público e privado, já que esse cuidado diferenciado é cada vez mais necessário e beneficia pacientes com comprometimentos sistêmicos vários”, observa.

Como cirurgião do Hospital Infantil Albert Sabin, na área de fissura labiopalatina, o professor também promove a interação de seus alunos com o ambiente hospitalar. “Nas clínicas da Unifor, dentro do GAPE, fazemos a adequação bucal e no hospital os graduandos em Odontologia me auxiliam nos procedimentos cirúrgicos e acompanhamento ambulatorial dos pacientes. Eles também participam junto comigo de campanhas e missões realizadas pela Smile Train, ONG americana, e Associação Beija-flor, uma ONG de Fortaleza, em prol desse público, os fissurados, já que sou cirurgião-voluntário em ambas. E é muito rica essa troca de experiências entre a universidade, o terceiro setor e o movimento de voluntariado”, festeja Assis Filipe. 

Salivar é preciso

A secura bucal já não rouba o sorriso de quem recorre ao projeto Saliva Artificial, nascido há 18 anos no curso de graduação em Odontologia da Universidade de Fortaleza, graças a pesquisas desenvolvidas e até hoje capitaneadas pelo professor e cirurgião bucomaxilofacial, Eliardo Silveira. “É campeão! Pela longevidade, porque nunca foi interrompido ao logo desse tempo todo e por sempre gozar de apoio na Unifor, gerando parcerias valiosas, como a que temos com o Hospital Geral de Fortaleza. Com repercussão na comunidade científica não só local, como nacional e internacional, o seu ineditismo é outro fator que lhe garante a boa fama”, reitera o pesquisador e também chefe do Serviço de Odontologia do HGF que há quase duas décadas quis e conseguiu amainar a hipossalivação de pacientes com câncer de cabeça e pescoço expostos a radioterapia.

“A pouca ou nenhuma saliva gera sérias alterações na boca e, agravada pela radioterapia, pode deixar sequelas estéticas e funcionais ligadas à deglutição, mastigação ou mesmo perda da língua. Então a Saliva Artificial veio para garantir o bem-estar do paciente e dar mais condições para ele seguir no tratamento. Desde que saiu do papel, há quase 20 anos, o projeto soma cerca de 500 atendimentos. Os beneficiados também recebem gratuitamente, duas vezes por mês, frascos de 200ml de saliva, além de todo o tratamento para o controle do câncer de cabeça e pescoço no que diz respeito à saúde bucal. Através da parceria com o HGF, que acolhe casos mais graves, a Saliva Artificial também ajudou a Odontologia a se fixar cada vez mais no hospital, além de garantir aos pacientes oncológicos o direito de mastigar e de sorrir, o que se reflete de imediato em sua auto-estima”, destaca o professor.

E Eliardo anuncia: os benefícios da Saliva Artificial já se estenderam para outros pacientes que apresentam secura bucal, como os que sofrem com a Síndrome de Sjögren, doença autoimune que afeta as glândulas produtoras de lágrimas e saliva, além daqueles que fazem uso contínuo de determinados medicamentos para controle de pressão arterial que resultam em hipossalivação. Apesar de notável, os louros do projeto não chegaram de imediato. “Era algo muito novo, na época, trabalhar com saliva artificial feita em laboratório e, por isso, não foi fácil convencer o hospital a se tornar parceiro da Unifor. Daí o meu aplauso sempre renovado para a instituição de ensino, pesquisa e extensão que não teve medo do novo e hoje é referência única, junto com o HGF, nesse feito e na literatura especializada”, comemora. 

Há mais a se comemorar. Diante dos casos de osteoradionecrose e dificuldade de cicatrização do osso mandibular devido à radioterapia, o professor fez valer uma nova ideia capaz de sanar ou dirimir o problema: “se o paciente viesse a perder algum dente e ali surgisse uma ferida ela não iria cicatrizar, então foi aí que a gente resolveu trabalhar com a oxigenoterapia hiperbárica, um tratamento especifico e especializado, que em Fortaleza só tem em um lugar, uma clinica particular, mas a preços altos. Pensamos em um produto barato a partir de um material vindo da natureza: água de coco em pó e sementes do flamboianzinho, nome popular da Caesalpinia pulcherrima. Ou seja, juntamos o citohormônio da água de coco em pó, que protege e cicatriza tecidos, e a galactomanana, substância que vem dessa planta. Dessa junção desenvolvemos um biofilme, hoje patenteado pela Unifor. Ao colocá-lo nas feridas, chegamos a um processo de cicatrização muito bom e bem mais rapidamente, sem falar no baixíssimo custo do procedimento. A aplicação do biofilme por nós não ultrapassa R$ 2,00, enquanto que no setor privado chega a R$ 300. Vencemos duplamente então, porque temos alcance massivo, beneficiando inclusive pessoas do interior do estado”.    

As pratas da casa

São dez projetos de extensão ativos só no curso de graduação em Odontologia da Universidade de Fortaleza (Unifor). Quem informa, com justificado orgulho, é o professor e assessor para assuntos regulatórios Sérgio Pereira, que gerencia de perto cada um deles, cuidando em paralelo da renovação anual do título de utilidade pública estadual que a Unifor pleiteia como selo de responsabilidade social. Para Sérgio, é duplamente positivo o fato de que boa parte dessas ações tem caráter interdisciplinar, envolvendo professores-orientadores e estudantes de diferentes áreas de formação do Centro de Ciências da Saúde.

Trata-se, portanto, de uma força-tarefa contínua que passa invariavelmente pelas duas clínicas odontológicas da Universidade de Fortaleza (Unifor): a Multidisciplinar (36 boxes) e a Clínica Integrada (19 boxes), sendo ambas abertas ao atendimento gratuito da população em geral por meio de processos de triagem. “O aluno da Odontologia dedica de quatro a oito horas por semana aos projetos, mas por conta da pandemia - e desde que foram autorizadas as atividade práticas via decreto estadual -, a capacidade ficou reduzida para manter o distanciamento social e aglomeração nas clínicas. Vejo os projetos de extensão como uma oportunidade valiosa para que o aluno desenvolva competências que somente na graduação não alcançaria, ampliando seus conhecimentos e beneficiando uma população economicamente frágil. São projetos que também promovem reintegração social. E alguns chegam a ser únicos em sua atuação, não conhecemos similares nem no estado, além de serem contínuos”, enfatiza o professor que torce declaradamente pela reativação plena das atividades em 2021, mas com toda a biossegurança exigida. 

Quem também figura como o chefe dessa torcida superorganizada é o coordenador do curso de graduação em Odontologia, professor Márlio Ximenes. Para ele, o projeto de extensão que mais interage com a comunidade externa em geral é justamente o atendimento na clínica odontológica, já que os demais atendem públicos específicos. “Todos os projetos de extensão têm sua inconteste relevância, mas nas clínicas atendemos centenas ou milhares de pacientes anualmente, o que resulta em números significativos de promoção à saúde bucal. Por isso, as clínicas devem ser celebradas especialmente, já que, no Curso do Odontologia, criado em 1995, somamos mais de 20 anos de excepcionais serviços prestados através delas”, sublinha. 

Mastigando políticas

Se internamente, na Unifor, os avanços em saúde bucal são dignos de boa nota há de se esperar e cobrar o mesmo das políticas públicas de saúde. É o que pensa o coordenador do curso de graduação em Odontologia, Márlio Ximenes, que ainda cobra maior valorização da Odontologia. “Trata-se de um desafio e conquista a um só tempo: a gente ser visto como profissional de saúde. Explico: falamos em plano de saúde e plano odontológico, como se a Odontologia estivesse fora da saúde. Outro exemplo: recentemente lançaram concurso para o Hospital Leonardo da Vinci. Todos os profissionais da saúde estavam contemplados, menos os dentistas, como se a saúde bucal estivesse à parte do cuidado da saúde. Então, ainda é preciso chamar atenção para que a sociedade nos enxergue como profissional da saúde, já que para se ter qualidade de vida é preciso garantir a saúde bucal. Que as consultas sejam de prevenção e não somente na hora em que se quebra um dente ou se está com uma dor. Por outro lado, os governantes têm que assumir a Odontologia como política de Estado, independente dos sucessivos governos”, defende o professor. 

Para ele, a defesa do Programa Brasil Sorridente é incontornável diante de recentes retrocessos numericamente visíveis. Reunindo dados oficiais, adverte: em 2003, existiam no Brasil 6.170 equipes de saúde bucal que estavam em 2.787 municípios e em 2017 as equipes saltaram para 24.053 espalhadas por 4.933 municípios dos 5.561 existentes no país. “Isso vale para ressaltar que o programa promoveu o acesso da população à saúde bucal, embora não possamos dizer que universalizou o serviço, já que não tivemos todos os municípios contemplados. No Ceará, dados de abril de 2020 dizem sobre uma cobertura na casa de 69,15% da população cearense. Temos então pouco mais de 6 milhões de pessoas cobertas pelas equipes de saúde bucal e mais de duas mil equipes trabalhando”, elenca.

Assumir a Odontologia como serviço essencial que precisa ser oferecido pelo Estado, segundo Márlio, é também um esforço pela atuação profissional em rede no âmbito da Atenção Primária, onde estão as equipes de saúde bucal da Família e os Centros de Especialidades Odontológicas (CEOs), além dos laboratórios especializados em próteses, que permitem procedimentos mais complexos no setor público e de forma gratuita.  “Hoje, no Ceará, em torno de 10% da população dispõe de plano odontológico. O restante vai usufruir do serviço público ou vai pagar de forma privativa. O grande sustentáculo de uma política de saúde bucal, portanto, é o governo, então isso tem que estar na agenda de qualquer político, partido ou gestor. Saúde bucal permite menos doença, uma melhor interação social, uma melhor capacidade mastigatória do paciente e qualidade de vida. Mas também estamos falando em salvar vidas, já que temos o câncer de boca e sua letalidade. Se houver diagnóstico precoce isso pode salvar a vida dos pacientes. Ou seja, Odontologia tem impacto nos mais diversos aspectos da vida do paciente. E o serviço público é que pode possibilitar o acesso”, vaticina. 

Com a boca no trombone

No Dia Nacional do Dentista, há de se aplaudir o “tribunal ético da profissão”. É assim que o presidente do Conselho Regional de Odontologia do Ceará (CRO-CE), Gladyo Gonçalves Vidal, define a entidade que vem comandando com um sentimento de responsabilidade social, a mesma que, aliás, também marcou a sua formação no Curso de graduação em Odontologia da Universidade de Fortaleza (Unifor). “Tomei posse ao final de 2018 tendo como um dos maiores objetivos estreitar os laços com a classe e os novos profissionais que se inserem no mercado de trabalho. Nossa ênfase também recai sobre a ética e o exercício legal da profissão, além da valorização da formação científica e defesa de nossos direitos. Por isso, promovemos cursos sobre assuntos de relevância social e política, além investirmos em uma frente judicial. Agora mesmo estamos judicializando a oferta de concursos e editais que não respeitam o piso salarial, uma lei de 1961. É que temos que mandar essa mensagem para o gestor público: a de remuneração digna da nossa profissão”, aferra.

Egresso da primeira turma da graduação em Odontologia da Universidade de Fortaleza (Unifor), o coordenador de saúde bucal da Prefeitura Municipal de Fortaleza, José Carlos de Sousa Filho, também engrossa o coro em defesa da classe.  “Penso que ainda carecemos de representatividade na Câmara Municipal e Assembleia Legislativa do Ceará para a defesa até do piso salarial da Odontologia, pelo qual nosso sindicato também briga. E apesar das dificuldades próprias do serviço público, que ainda é muito burocrático, em 8 anos de gestão temos o que comemorar: na capital, evoluímos de 85 postos de saúde com atendimento odontológico para 115, incluindo aí todo um redimensionamento dos equipamentos odontológicos. Em 2013 eram dois CEOS e vamos terminar com quatro. Teremos, ao final da gestão, uma cobertura de saúde bucal da ordem de 46%, o que representa uma das maiores do Brasil. Então, os processos de trabalho foram fortalecidos, também porque investimos em educação permanente, estando inclusive concluindo uma pesquisa, junto às instituições de ensino parceiras, o que inclui a Unifor, que vai nos informar o índice de cáries no município de Fortaleza. E assim, entre desafios e conquistas, seguiremos avançando”, assegura.