Copa do Mundo 2022 traz à tona denúncias de violação dos direitos humanos no Catar

qua, 30 novembro 2022 14:23

Copa do Mundo 2022 traz à tona denúncias de violação dos direitos humanos no Catar

No país, opressão contra segmentos da sociedade, como mulheres e a comunidade LGBTQIA+, alerta comunidade internacional


Em meio a críticas, Catar foi escolhido em 2010 pela Fifa como sede da Copa do Mundo deste ano (Foto: REUTERS/John Sibley)
Em meio a críticas, Catar foi escolhido em 2010 pela Fifa como sede da Copa do Mundo deste ano (Foto: REUTERS/John Sibley)

A Copa do Mundo 2022, que está sendo realizada no Catar, evidenciou uma preocupante realidade que engloba o país sede do evento: a opressão a segmentos da sociedade e a violação dos direitos humanos. Diversas denúncias vêm sendo realizadas pela comunidade internacional desde antes da abertura da competição, que aconteceu no dia 20 de novembro. 

Escolhido pela Fifa em 2010 para sediar o evento, o Catar é um dos 70 países do mundo que criminalizam relações entre duas pessoas do mesmo sexo, segundo a organização Anistia Internacional. Penas de até sete anos de prisão são aplicadas caso haja o descumprimento dessa lei, de acordo com os artigos 285 e 296 do código penal local. 

No país, mulheres também sofrem diversas opressões. Elas vivem sob o regime de tutela masculina, na qual é estabelecido a subordinação a um tutor, que pode ser o pai, marido e o até irmão. Com isso, elas necessitam de permissão para decisões de relevância na sua vida, como estudar, realizar tratamentos de saúde e casar. 

Além disso, violações aos direitos trabalhistas também são registrados no Catar. Ativistas de direitos humanos apontam que cerca de 15 mil trabalhadores morreram durante os preparativos para a Copa devido a condições de trabalho subumanas. Uma reportagem do jornal britânico The Guardian denunciou que até 6.500 trabalhadores imigrantes sul-asiáticos morreram desde a escolha do país como sede.

Para Ana Maria D’Ávila – docente do curso de Direito da Universidade de Fortaleza, da Fundação Edson Queiroz, e especialista em Direitos Humanos –, o Catar é um retrato claro de que as questões que englobam os direitos dos seres humanos são, para além de um fator moral, representações de poder.


“Embora exista a pretensão de que os direitos humanos devam ser universais, a realidade mostra que a humanidade ainda não compartilha os mesmos valores. E é esse justamente o cerne da discussão. Quais os valores corretos? Quais os valores que a humanidade deve ter como referências universais? A história mostra que a resposta a essa pergunta nem sempre foi dada por quem tem a razão, mas por quem tem o poder”
Ana Maria D’Ávila, docente do curso de Direito da Unifor e especialista em Direitos Humanos

A docente avalia que a realização da Copa do Mundo em uma nação culturalmente tão distinta é uma oportunidade de discutir e refletir de forma mais ampla sobre as questões de direitos humanos. “É um evento que está levando muitas pessoas a refletirem sobre o que é viver em um país com diversas restrições. Inclusive, as próprias pessoas do Catar sabem que seus valores, seus costumes e suas tradições estão sob o escrutínio mundial. É uma oportunidade para culturas diferentes refletirem sobre si”, pontua.

Manifestações

Frente à realidade encontrada no Catar, denúncias e protestos estão sendo realizados por visitantes do país e por seleções que estão disputando a competição. Um grupo de brasileiros, por exemplo, denunciou que teve uma bandeira do estado de Pernambuco confiscada por policiais locais, que a confundiram com a da comunidade LGBTQIA+. Vale ressaltar que o país também impõem restrições à liberdade de expressão.


Atletas da seleção alemã fizeram manifesto contra censura antes da estreia na Copa do Mundo 2022 (Foto: Reuters)

Jogadores de diversas seleções estão expressando indignação com a situação do país, principalmente pela proibição por parte da Fifa do uso da braçadeira da campanha “One Love”, de apoio à comunidade LGBTQIA+. Atletas da Alemanha, por exemplo, fizeram o gesto de tampar a boca antes de sua estreia na competição, em alusão à censura realizada. Já o técnico da Dinamarca afirmou que vai avaliar a medida, pois acredita que “defender a diversidade não pode e não deve ser uma declaração política”. 

Em meio a esses movimentos, Ana Maria D’Ávila destaca a importância dos demais países também fazerem uma autocrítica: “Assim como no Brasil, em muitos outros países, incluindo europeus, inúmeras pessoas são exploradas todos os dias. Isso serve para desculpar as violações que acontecem no Catar? Não, mas mostra a hipocrisia da sociedade mundial que costuma apontar os erros dos outros, sem combater suas próprias mazelas”.

O que são os direitos humanos? 


Atletas entram em campo utilizando braçadeira “No Discrimination” (Sem Discriminação, na tradução livre) em protesto às violações de direitos humanos no Catar (REUTERS/Lee Smith)

Os direitos humanos são pretensões juridicamente garantidas que protegem a dignidade de todos os seres humanos. Eles encontram-se previstos em documentos jurídicos internacionais e há, inclusive, órgãos e tribunais internacionais encarregados de protegê-los e julgar os Estados que os violem. O único requisito para ser titular de um direito humano é ser um ser humano.