null Entenda como tem sido a participação e o uso do TikTok neste período eleitoral

Qui, 21 Julho 2022 18:47

Entenda como tem sido a participação e o uso do TikTok neste período eleitoral

Plataforma tem o potencial de aproximar os jovens da política, mas ainda é questionada sobre “superficialidade”


Aplicativo já conta com perfis de políticos e instituições democráticas, como o Tribunal Superior Eleitoral e o Supremo Tribunal Federal (Foto: Pixabay)
Aplicativo já conta com perfis de políticos e instituições democráticas, como o Tribunal Superior Eleitoral e o Supremo Tribunal Federal (Foto: Pixabay)

Em 2014, as lojas de aplicativos virtuais adicionaram mais um nome aos seus catálogos: a plataforma “musical.ly”, voltada para edição de vídeos curtos e musicais como forma de entretenimento. Quatro anos depois, o app mudou de nome, mantendo, no entanto, o seu propósito inicial. Surgia assim o TikTok, que teria o seu boom em 2020, especialmente durante a pandemia de Covid-19. 

De acordo com dados da agência App Annie, o brasileiro gasta, em média, mais de cinco horas do seu dia em aplicativos, e os tem como fonte principal de informações. Ademais, dados da Comscore, empresa estadunidense de análise da internet, revelam que no Brasil, dos 126,5 milhões de habitantes com acesso à internet, 97,6% usam redes sociais. Desse número, 58% são usuários da plataforma de compartilhamento de vídeos rápidos. 

A princípio, o TikTok era conhecido por suas dancinhas virais e conteúdo cômico, e tanto o perfil de seus usuários quanto a sua proposta de uso não abriam muito espaço para manifestações políticas. Porém, essa é uma realidade que está em transformação, pois com a aproximação das eleições, o debate político vem se inserindo cada vez mais na plataforma, aumentando o seu potencial de influência na disputa eleitoral deste ano. 

Esfera pública e as redes sociais

Os dados citados anteriormente mostram como as redes sociais, em especial o TikTok, se tornaram espaços nos quais a esfera pública se articula. Antes, debates dessa natureza eram muito comuns em centros políticos, escolas e universidades, mas a sociedade atual acrescentou mais um local no qual a política pode e deve ser debatida, com o intuito de alcançar cada vez mais pessoas: o digital. 

Gabriela Lima, doutoranda em Ciência Política pela Universidade de Lisboa e coordenadora do curso de Especialização em Direito Digital e das Startups da Universidade de Fortaleza, da Fundação Edson Queiroz, relembra que, ao começar a estudar a relação entre tecnologia e sociedade, muito se falava sobre a internet e as redes sociais como uma potencializadora de uma democracia mais participativa e mais direta. 

Hoje, no entanto, com crescentes abusos no ambiente virtual, alguns cuidados e limites já foram criados para essa relação. “Mas eu ainda vejo a internet e as redes sociais como democratizadoras do conhecimento político e vetores de potencialização de certas atitudes cidadãs, como a participação e o engajamento social. E, definitivamente, é muito importante que os políticos estejam engajados nessas redes, trazendo não só transparência para seus mandatos, mas também essa aproximação com as demandas sociais”, pontua Lima.

Os jovens estão conectados

O relatório Juventudes e Democracia na América Latina, coordenado pelas pesquisadoras Esther Solano e Camila Rocha, mostra o entendimento dos jovens de quatro países do continente (Argentina, Brasil, Colômbia e México) em relação à democracia, e como eles se informam e participam da política. Em suas conclusões, o documento informa que os jovens, em sua grande maioria, defendem a democracia, mas se sentem muito desconectados emocional e afetivamente das instituições democráticas. 


(Foto: Ares Soares)

“Isso vem de uma desconexão, de uma dissonância, muitas vezes, entre a comunicação dessas instituições, que são tão tradicionais, com os jovens, que têm outro tipo de comunicação, outras preocupações. E as mídias digitais podem aproximar essas instituições, mesmo carregadas de tradicionalismo, dessa população mais nova”
Gabriela Lima, coordenadora do curso de Especialização em Direito Digital e das Startups

Um grande exemplo de como as redes sociais podem aproximar os jovens da política foi o engajamento de muitos artistas e figuras públicas convocando os jovens entre 16 e 18 anos a tirarem o título de eleitor. A mobilização resultou no ganho de 2.042.817 novos eleitores, um aumento de 47,2% em relação ao mesmo período em 2018, de acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Para a doutoranda, números como esse mostram que os jovens estão conectados e querem participar da política. Entretanto, eles querem ter uma voz ativa a partir daquilo que consideram importante. Assim, Gabriela reforça que, em sua visão, as mídias podem ser utilizadas muito mais para conversar sobre ideais e sobre um futuro compartilhado, e o que a sociedade pode fazer para alcançar o que deseja. 

Eduarda Pessoa, jornalista graduada pela Unifor, também acredita que as redes têm o potencial de unir os jovens e a política. Entretanto, ela lança dois questionamentos: “como fazer isso?” e “quais são os ‘gatilhos’ para atrair esse público?”. A egressa, que em seu Trabalho de Conclusão de Curso, desenvolveu o perfil PoliTik no TikTok para falar sobre política e tornar o jornalismo político mais acessível, explica que a plataforma tem um algoritmo muito aguçado, e mostra para o usuário apenas o que ele tem interesse. 

Nas métricas que colheu até agora, Pessoa observa o perfil de seus seguidores e conclui que a maioria se adequa ao público mais velho e masculino, que geralmente já tem o interesse prévio por política, e consomem esse conteúdo no aplicativo. 

“Então, como atrair [outros usuários]? Você vai ter que usar os recursos da plataforma, hashtags e pensar em formas de ampliar e entregar os seus vídeos. Mas, a lógica do algoritmo é muito direcionada, então também tem esse desafio, porque o TikTok tem uma entrega muito boa, ao passo que ele seleciona o público a partir dos rastros de pesquisa e de conteúdo que ele consome”, esclarece ela.

E a superficialidade?

Atualmente, o TikTok permite vídeos de até três minutos. Há quem diga que é um tempo reduzido para produzir conteúdos completos, e que isso reforça a superficialidade já tão presente na sociedade contemporânea. Porém, mesmo que o tempo mais condensado deixe determinados tópicos mais superficiais, é importante lembrar que a discussão política tradicional já é baseada na veiculação de mensagens curtas. 

Gabriela Lima analisa que o trabalho nas redes sociais é uma nova configuração de comunicação, e que a comunicação política deve se adaptar a isso. “Acho que quem quer se comunicar vai entendendo essas tendências e vai passando a adaptar a forma como fala. Eu vejo que se você quer criar esse relacionamento com o seu eleitorado, com as pessoas que querem te ouvir, o TikTok pode ser uma boa plataforma, até porque os vídeos são muito curtinhos, mas se você tem esse relacionamento que perdura no tempo, você consegue conversar muito”, afirma a docente.

Eduarda Pessoa observou na prática a demanda por vídeos curtos no aplicativo, mesmo por parte de um público mais velho. A jornalista conta ter constatado uma necessidade em acelerar seus vídeos e sua fala para conseguir prender as pessoas até o fim do conteúdo. 


(Foto: Arquivo Pessoal)

“As pessoas não assistem [o vídeo] até o final. O negócio é a rolagem, a pessoa está lá pra rolar e ver vídeo. Então, isso é um desafio, e a gente entra nessa questão da superficialidade, mas a gente também entende as redes sociais, e eu até disserto sobre isso no meu projeto, como local de passagem, no qual as pessoas terão o primeiro contato com o tema e só então se aprofundarão nele. O que eu faço, por exemplo, para tentar mediar isso, é sempre deixar as fontes de todas as informações que eu coloco no vídeo, para eventualmente se a pessoa se interessar, ela se aprofundar sobre aquele tema”, assegura a egressa.

Parceria com o Tribunal Superior Eleitoral

Por ser uma plataforma relativamente “nova”, muito se debate sobre o que se pode penalizar ou não em relação à expressão política no TikTok. Desse modo, como garantir, especialmente nessa época eleitoral, que políticos e instituições democráticas adeptas ao aplicativo estão respeitando as leis?. Segundo Gabriela, essa já é uma preocupação muito genuína, e já tem sido discutida pelo Direito Digital e pelo Direito Eleitoral.

“E essa preocupação é algo que todos nós devemos ter enquanto cidadãos, de manter a integridade do processo eleitoral. Institucionalmente, a nível nacional, o responsável por isso é o TSE, e ele tem feito um trabalho muito consistente de parceria com todas essas redes sociais, como WhatsApp, Instagram, Facebook e o TikTok, pelo Projeto de Combate à Desinformação, que foi lançada em 2019 e se tornou permanente em 2021”, afirma a doutoranda em Ciência Política.

A coordenadora explica que, por meio desse programa, foi firmada uma parceria com a plataforma de compartilhamento de vídeos em fevereiro de 2022, justamente para que o TikTok entrasse também como um fiscalizador do processo eleitoral e do conteúdo que está sendo disponibilizado no aplicativo. Assim, o app terá uma página central de informações confiáveis sobre a eleição, e se comprometeu também a abrir um canal de denúncia.

“Essa é uma forma em que as redes sociais se mobilizam para que esse conteúdo, de alguma forma, seja regulado. Para que a liberdade de expressão seja utilizada na maior medida possível, sem invadir a esfera de outra pessoa e sem prejudicar a qualquer outro indivíduo envolvido em todo esse processo”, finaliza Lima.