seg, 2 junho 2025 14:26
PL da Devastação: entenda debate sobre a nova Lei Geral do Licenciamento Ambiental
Aprovado em maio no Senado, Projeto de Lei flexibiliza regras ambientais e gera controvérsias entre desenvolvimento econômico e preservação ambiental

No mês de maio, o Senado Federal aprovou, por 54 votos contra 13, o Projeto de Lei (PL 2159/2021) que cria a Lei Geral do Licenciamento Ambiental. Tramitando há mais de 20 anos no Congresso Nacional, a proposta tem objetivo de padronizar e simplificar as regras de licenciamento em todo o país, estabelecendo diretrizes nacionais para conferir mais clareza, segurança jurídica e celeridade aos processos.
Defensores da proposta, de maioria ligada à bancada ruralista e ao agronegócio, acreditam que ela servirá para “desburocratizar” a obtenção de licenças ambientais. Enquanto isso, críticos do PL da Devastação, como é conhecido entre os ambientalistas, apontam a flexibilização do licenciamento como um caminho ainda mais aberto para a destruição do meio ambiente.
Mas afinal, sobre o que realmente se trata esse PL? Conversamos com a advogada e pesquisadora Maria Clara Negreiros, curadora e docente da Especialização em Direito Ambiental e Sustentabilidade Corporativa da Universidade de Fortaleza — instituição vinculada à Fundação Edson Queiroz —, para entender isso melhor e refletir sobre a importância da academia na análise técnica e jurídica do tema.
O que diz o PL da Devastação?
O Projeto de Lei estabelece regras gerais para o licenciamento ambiental no Brasil, com a promessa de padronizar procedimentos entre os três entes federativos. Entre os principais pontos, estão a criação de novas modalidades de licenças, como a Licença por Adesão e Compromisso (LAC) e a Licença de Operação Corretiva (LOC), além da dispensa de licenciamento para atividades como agricultura de pequeno porte, obras emergenciais e manutenção de infraestrutura.
De acordo com Maria Clara, “o projeto busca tornar o processo mais ágil, digital e previsível para empreendimentos que utilizam recursos naturais, conferindo mais segurança jurídica e celeridade aos processos”. Ela diz que a falta de uma legislação nacional unificada sobre o tema gera insegurança e judicialização de projetos em todo o país.
O tema ambiental segue em alta e gerando debates acalorados sobre o futuro e o presente do meio ambiente nacional (Foto: Getty Images)
Os defensores do PL, entre eles representantes do agronegócio, infraestrutura e energia, argumentam que o atual sistema é ineficiente, atravancado por burocracias e divergências entre legislações estaduais. Eles acreditam que o novo modelo vai destravar investimentos, acelerar obras e gerar empregos, ao mesmo tempo em que não elimina o controle ambiental.
A professora Maria Clara, que é especialista em direito ambiental e minerário, observa que “há um discurso que contrapõe desenvolvimento econômico e proteção ambiental, mas essa é uma dicotomia artificial. O desenvolvimento sustentável pressupõe o equilíbrio entre os dois pilares”.
Ela alega que o texto da PL deveria avançar em mecanismos de transparência e controle social para evitar que a flexibilização resulte em danos irreversíveis. “Não se trata apenas de desburocratizar, mas de garantir que os empreendimentos cumpram seu dever de prevenir e mitigar impactos”, reforça a advogada, que é doutoranda em Direito Público pela Universidade de Coimbra.
Por que “PL da Devastação”?
Críticos do Projeto de Lei afirmam que a LAC, por exemplo, representa um enfraquecimento dos instrumentos de controle, ao permitir que o empreendedor apenas declare que cumpre os requisitos legais, sem necessidade de análise técnica prévia. Já a LOC regulariza empreendimentos que já operam sem licença, abrindo brechas para anistia de danos ambientais.
Outro ponto é a dispensa de Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) em diversas situações. “Essa mudança limita a capacidade do Estado de prever e prevenir danos ambientais relevantes, comprometendo princípios básicos do direito ambiental, como o da precaução”, alerta a professora.
Ela acrescenta que: “A participação de comunidades tradicionais e órgãos técnicos também fica fragilizada, o que é especialmente grave em um país com tanta diversidade socioambiental como o Brasil”.
Consequências da aprovação
Os efeitos do PL dependerão da maneira como for regulamentado e implementado por estados e municípios. “Se houver estrutura institucional e fiscalização eficaz, é possível equilibrar celeridade e responsabilidade. Mas, sem isso, abre-se caminho para retrocessos graves”, analisa a professora.
Entre as possíveis consequências estão o aumento de desmatamento em áreas sensíveis, prejuízos a comunidades tradicionais e populações indígenas, e a fragilização da governança ambiental. Para os cidadãos em geral, a perda de qualidade ambiental pode se traduzir em impactos diretos sobre saúde, segurança hídrica e eventos climáticos extremos.
“A segurança jurídica verdadeira não vem da flexibilização irrestrita, mas da clareza normativa aliada ao rigor técnico. Precisamos de marcos legais sólidos, mas também de instituições fortalecidas e capacitadas para sua aplicação” — Maria Clara Negreiros, advogada especialista em direito ambiental e minerário e docente da Pós-Unifor
Mobilização e resistência
Diversas entidades da sociedade civil, ONGs e movimentos ambientais estão se mobilizando para tentar barrar a sanção do projeto ou pressionar por ajustes. Petições, audiências, campanhas e articulações com parlamentares fazem parte das estratégias.
“É fundamental que profissionais da área ambiental estejam preparados para lidar com esse novo cenário”, afirma Maria Clara. Ela ressalta a importância da formação técnica e jurídica atualizada, destacando o papel da Unifor na oferta de uma especialização focada em direito ambiental e sustentabilidade corporativa.
A professora destaca que a complexidade do licenciamento demanda profissionais com formação sólida e uma abordagem multidisciplinar, preparados para enfrentar os desafios desse novo marco legal com responsabilidade e pensamento crítico.
Com a aprovação no Senado, o texto segue para análise da Câmara dos Deputados. Se aprovado sem modificações, segue para sanção presidencial. Caso haja alterações, retorna ao Senado. A expectativa é que a votação ocorra nas próximas semanas, em meio a pressões de diferentes setores da sociedade.